"Quero
que saibam qual o motivo de se defenderem os índios de tal maneira.
Hão de saber que eles são súditos tributários das Amazonas, e
conhecida a nossa vinda, foram pedir-lhes socorro e vieram dez ou
doze. A estas nós a vimos, que andavam combatendo diante de todos os
índios como capitães e lutavam tão corajosamente que os índios
não ousavam mostrar as espáduas, ao que fugia diante de nós,
matavam a pauladas. Eis a razão por que os índios tanto se
defendiam.
Estas
mulheres são muito alvas e altas, com o cabelo muito comprido,
entraçado e enrolado, na cabeça. São muito menbrudas e andam nuas
em pêlo, tapadas as suas vergonhas, com os seus arcos e flechas nas
mãos, fazendo tanta guerra como dez índios. E em verdade houve uma
dessas mulheres que meteu um palmo de flecha por um dos bergantins, e
as outras um pouco menos, de modo que os nossos bergantins pareciam
porcos-espinhos."
(Frei
Gaspar de Carvajal)
"Deve
ser ainda mencionada aqui uma farsa, denominada SERRAÇÃO DA VELHA,
indicadora de que já passou metade da quaresma. Essa brincadeira é
organizada pelos soldados. Para a zombaria é escolhida, entre as
moradoras da cidade, uma mulher já idosa, mas ainda coquete. Quando
pois, é chegado o tempo, já essas mulheres estão preocupadas e
temerosas de serem colhidas pela sorte. Faz-se uma figura recheada de
palha, tão parecida quanto possível com a mulher em apreço, com
trajes iguais aos que ela costuma usar, de modo a ser reconhecida
imediatamente. Numa das mãos põe-se-lhe um rosário e na outra uma
serra para indicar que o jejum quaresmal é cortado ao meio. Então a
figura é posta numa padiola e, acompanhada pelos soldados com sabres
desembainhados e archotes, é conduzida por quatro negros através da
cidade, por entre a jubilosa gritaria dos negros e das crianças. Um
grotesco mascarado abre o cortejo e, durante as paradas, lê o
testamento da velha, composto com grande exagero, em que são
vituperadas as suas vaidades da maneira mais inconveniente. Toda a
tropilha aplaude furiosamente. Finalmente, chegando cortejo à
residência da própria mulher, a figura é serrada em duas e
queimada, o que sempre termina em pancadaria, porque os parentes da
vítima se sentem igualmente ofendidos e procuram enxotar os
indelicados visitantes."
(Johann
Emmanuel Pohl)
"Começou
a seguir um caminho muito longo. Lá adiante encontrou Acarajé e
pediu-lhe que o ajudasse a preparar-se que lhe ensinaria o caminho.
Ela o fez de boa vontade e ele indicou-lhe a estrada. Andou, andou e
lá adiante encontrou umas pedras grandes com forma de gente que lhe
pediram que ela os colocasse melhor. A menina com muito esforço
conseguiu fazer e as pedras lhe ensinaram o seu caminho. Adiante
encontrou Adjinacu (Cágado?) que também lhe pediu prestasse o
serviço de auxiliá-lo no trabalho que estava fazendoe a menina
prestou-se de boa vontade. Também Adjinacu mostrou-lhe o caminho.
Muito adiante encontrou uma onça parida, a quem pediu que ensinasse
o caminho e a onça lhe perguntou se não tinha medo de ser comida,
repondeu que a comesse logo para acabar com a sua lida. A onça
ensinou-lhe o caminho. Adiante encontrou um menino que batia feijão.
Pediu que lhe ensinasse o caminho, e o menino disse que o fazia se
ela o ajudasse."
(Raimundo
Nina Rodrigues)
"A
PIRANHA
Compõe-se
de homens, mulheres e até crianças que formam uma grande roda,
saindo ao meio dela um dos dançantes que executa passos variados ao
tempo, em que os da roda girando à direita e à esquerda, cantam:
Chora,
chora, piranha.
Torna
a chorar, piranha:
Põe
a mão na cabeça, piranha.
Piranha!
Põe
a mão na cintura...
Piranha
Dá
um sapateadinho.
Mais
um requebradozinho...
Piranha
Diz
adeus ao povo,
Piranha
Pega
na mão de todos,
Piranha
A
tal piranha faz o que se lhe manda, chorando, pondo a mão na cabeça,
etc. Por fim conseguindo agarrar a mão de um qualquer dos da roda,
puxa-o para o meio do círculo, tomando-lhe o lugar. Assim se
continua."
(Antônio
Americano do Brasil)
ANTOLOGIA
DO FOLCLORE BRASILEIRO – Luís da Câmara Cascudo.