Ioga, Hinduísmo e o Balde
Os lendários Vedas. Mais de 2 mil anos de influência
contínua e tudo começou em uma tradição oral. O quão perto esteve de se perder
aquelas mensagens? Quantas alterações o texto sofreu? Difícil não pensar mesmo
em inspiração divina na semente central daquelas palavras. Do primitivo (“primitivo”
em sentido stricto sensu, seus
modernosos de narizinho empinado) politeísmo que encontra deuses em toda parte
e termina em uma das visões filosóficas mais sofisticadas já criadas pelo
humano. Descrição de rituais para um cotidiano feliz, uma ode às florestas e cuidados
interiores para a meditação. A última parte, também chamada de Upanishads ou Vedanta, decifra e explica o
Ser.
O Purusha é a consciência,
só a consciência; mas também é eterno e a beatitude. E não faria sentido que tudo fosse mutável e mal e também
inconsciente de si mesmo. O Purusha se
manifesta de muitas formas, uma delas é uma ondinha que nasce no meio do oceano
infinito por causa de meio segundo de brisa: você e eu. Mas a gente costuma se
iludir pensando que somos corpo, mente e alma e sei lá mais de fator X que nos
torna únicos e especiais. Haja meditação para que esse erro seja corrigido,
para sermos felizes!
A professora de Matemática
vai dizer que combinando três pedaços não dá para fazer um universo, mas dá
sim. Se os três pedaços forem os gunas.
Tamas (inércia, paralisia, distração,
sabedoria no meio da neblina espessa, o cavaquinho parado), Rajas (atividade, paixão, devoção e
desejo, o dedilhar do cavaquinho) e Sattva
(claridade, saúde da vida, felicidade terrena e conhecimento interior; e a
composição do samba antes do artista pegar o cavaquinho).
A meditação e a sabedoria
estão pegando fogo. Aproveite e jogue as sementes do seu passado no fogo e
transforme-se em uma pessoa livre.
É possível agir sem que o jogo
de dominó termine mal para mim? Sim. Na verdade essa é um dos principais
ensinamentos hindus, o evitar as
consequências cármicas negativas. Para isso basta ter a divindade como
patrão e não esperar salário. Agir com desprendimento e generosidade, tendo como
meta a harmonia com a divindade universal.
É um labirinto, portanto cuidado
para não se perder. O primeiro e mais importante pensamento é o básico e
primitivo “EU”. A partir daí você segue o caminho comum, mais pensamentos, dores,
prazeres, sonhos e pesadelos, sair da cama, estudar, se casar, tomar uma
cerveja com amigos para rir do Paulo que levou um drible no jogo de futebol...
Mas... Mas... Se você, antes de dar o segundo passo no labirinto, perguntar
“quem é esse EU?”; a situação muda. Mas atenção: é para perguntar e perguntar e
perguntar e perguntar... Quanto mais você investigar QUEM esta pensando os
pensamentos que VOCÊ esta tendo em sua mente, mais você ilumina a sua fonte
original e isso aquieta a mente. “Mas e o perigo de ficar egocêntrico e isolado?”
Mas é justamente o contrário: como a mente quer se conhecer antes de andar no
labirinto, ela vai caminhar por ele tranquilamente. O labirinto será todo
percorrido, mas você nunca perderá a sua fonte de água.
Pode parecer uma técnica
prática pequena para ajudar na meditação diária, mas não é uma técnica prática
pequena para ajudar na meditação diária. As canções são bonitas, de origem
divina e são convites para o divino entrar/manifestar em forma de alegria e paz
em você. Enfim, são músicas bonitas e é chique também porque elas são bem
antigas. E ora bolas, siga a tradição iogue já que você está meditando!
Como a bateria do celular;
se o seu corpo estiver suficientemente forte e purificado, do primeiro chakra (centro de consciência) perto do
bumbum até o sétimo (o lótus de mil pétalas) no alto da cabeça será caminho da
misteriosa energia kundalini. Aí como
lâmpada você se ilumina mesmo. Meeeesmo!!!!
A prática ioga, naturalmente
você já deve ter desconfiado, nada tem de ficar sentado em lótus sem fazer
“nada”. Há muita atividade e muitos objetivos a serem alcançados. É difícil.
Agora imagine a “ioga real”, a Raja Ioga. Imagine uma pessoa jovem, e mesmo uma
pessoa adulta, ocidental, com internet e essa televisão por assinatura, tantos
estímulos pelo celular, tantas imagens e desejos fortes o tempo todo; imagine
escutar sobre paz interior e controle de pensamento? A pessoa iria achar um
milagre. Bom, de certa forma é um milagre.
Enfim, enfim, a Raja Ioga é algo complexo e amplo. Segue, como aperitivo, ou convite
ou susto, a lista de estágios a serem percorridos aos praticantes. Sinta o
drama: abstenções, observâncias, posturas, controle da energia vital,
interiorização, concentração, meditação e iluminação. Deu aquele desânimo, não
é? E eu que fui meditar e antes de começar, eu dormi? Mas é como observa meu
amado Will Durant: as dificuldades
estimulam os fortes. E é o seu caso.
Uma iogue é uma iogue, mas é
também uma neurocirurgiã operando a própria mente enquanto vive normalmente. E
para tornar a metáfora ainda mais fascinante, a profissional talentosa da
medicina tem como bisturi mágico um presente da energia vital chamada prana (ou pranayama). Muito chique mesmo. Mas é exato: há uma mente a ser
operada por meio da meditação. Cortar as partes ruins e assim iluminar-se.
Eu sou eu há muito tempo. O
que não quer dizer que eu estou acostumado comigo mesmo sempre, ou que eu morra
de amores por mim mesmo o tempo todo. Preciso escutar/aprender aquela música do
Ultraje a Rigor: “eu me amo, eu me
amo/eu não posso mais.../viver sem mim...”. Enfim, onde eu estava? Entre os
ensinamentos todos ricos da ioga e a tradição hindu eu tinha que destacar o que
é ensinado sobre a concentração. Como eu vivo no mundo da Lua eu tinha que
destacar esse trem. Bom bom, concentração é a atenção fixada sobre um objeto.
Normal começarmos com uma definição simples e direta. O grande jogo começa
depois. Antes de qualquer coisa, beeem previamente, é preciso que você já
esteja treinado na interiorização. Se o seu interior ainda estiver uma bagunça,
não adianta. Depois é preciso saber que concentrar-se é duas partes: desligar
os vários telefones do escritório e só depois você age escolhendo o alvo: pode
ser um dos telefones, a janela, a agenda de contatos, uma carta sobre a mesa, o
quadro que você nunca reparou direito... Dito isso uma nota sobre a iluminação:
a iluminação é refletir a luz de tudo sobre você. Então quando alguém se
ilumina não quer dizer que vira uma espécie de lâmpada, é mais se tornar uma
espécie de espelho de tamanho infinito refletindo o tudo tudo.
Hari Dass tem
uma lição para você:
“Se você perseguir o mundo, o mundo fugirá de
você.
Se você fugir do mundo, ele o
perseguirá.”
Naturalmente
que a resposta para este dilema em minha opinião só pode ser dançar. Certo, Hari Dass?
Não perca a calculadora e
nem o calendário, pois são exatos 25 anos estudando, mais 25 anos cuidando da
família, aí tem 25 anos imitando o Henry
David Thoreau no bosque do lago Walden e por último mais 25 anos
renunciando qualquer coisa que realmente não presta.
Os hindus tem mais
obstáculos a enumerar do que os budistas, mas ainda sim são menos que os sete
pecados capitais da tradição católica. Os hindus têm cinco cascas de banana no
caminho, são elas: aversão, desejo, egoísmo, ignorância e medo. O Mick Jagger não conseguia sentir
satisfação porque não sabe que os sentidos do corpo são empregados não os
mestres as quais devemos seguir. Como esperar no ponto de ônibus e pegar o
ônibus errado. Dito isso é bom lembrar que a principal casca de banana que os
hindus nos alertam que está no meio do caminho para nos atrapalhar é a
ignorância. É que o mundo é tão atraente que nos puxa e prende, aí confundimos
o brilho na careca do meu avô Waldir
com o próprio sol. A consequência confundida com a causa. Ignoramos a fonte Self.
Não somos passageiros deste
mundo, passageiros apenas viajam e olham pela janela. Tiram fotos e perguntam
sempre as mesmas coisas aos guias turísticos. Não, não. Sim, não há morte ou
nascimento. Mas não somos passageiros deste mundo, somos uma empregada
doméstica que sabe amar. Uma empregada doméstica que sabe amar o trabalho, a
família dona do castelo; mas que sabe que sua verdadeira casa é em outro lugar.
Captou a metáfora? Não somos passageiros deste mundo, somos uma empregada
doméstica que sabe amar. Gostou da lição? É do Sri Ramakrishna.
Eu ia chamar um vizinho, um
colega de trabalho, a moça que fica na rua vendendo pipoca doce, um político do
Partido Liberal, mas resolvi ser contemporâneo (outubro de 2023): somente
quando o líder do... Ah... Não quero dizer o nome de dois dos nomes principais
do atual conflito Israel-Hamas. Não é hipocondria jurídica é desânimo mesmo. De
um lado pessoas morrendo, do outro pessoas gritando um monte de m* sem parar.
Até casos de antissemitismo no Brasil essa guerra sórdida anda produzindo.
Inacreditável. Enfim, onde eu estava? Quando a gente sentir unidade profunda
com as outras pessoas o amor divino irá brotar em nós. Antes não. Politeísmo
difícil: divindade em todas as pessoas.
O guru deve saber que por trás
de estudantes insuportáveis que não conseguem nem chegar no horário das aulas,
há a manifestação do Self perfeito sim. O guru tem que ser um exemplo de
humildade e equilíbrio. Muitos são o que se dizem gurus, poucos são os gurus de
verdade. Vou reconhecer o meu? Queria ter mais de um. E você que me lê, sabe
reconhecer uma lâmpada humana no meio da floresta escura?
Agora vai uma citação porque
ela é um elogio que não é leve ou diplomático.
“A maior importância da Ioga está na eficácia
prática das técnicas. A experiência, mais do que o conhecimento teórico,
constitui a essência da Ioga. As diversas disciplinas da Ioga incluem práticas
apropriadas para virtualmente todos os indivíduos, tenham eles uma disposição
emocional, intelectual ou ativa. Nenhuma outra doutrina contém métodos tão
diferentes para desenvolver a autodisciplina, adquirir um sentido de paz
interior e atingir a auto-realização.”
(James Fadiman e Robert
Frager em Teorias da Personalidade
[página 334, traduções de Camila Pedral Sampaio e Sybil Safdié;
com a coordenação de Odette de Godoy Pinheiro, 1979, São Paulo, Editora:
Harbra Editora Harper & Row do Brasil Ltda]).
A primeira vez que Sri
Ramakrishna viu a Grande Mãe foi justamente no momento em
que ele queria terminar tudo pegando a espada no templo e... Como um sol
aparecendo de repente no quarto escuro Ela apareceu a ele. Seu coração não era
mais uma toalha molhada torcida, escorrendo todo o ânimo, todo amor que queria
sentir e praticar neste mundo.
Uma vez Ramana Maharshi sentiu tanto tanto medo da morte acabou que olhando
para si mesmo de um jeito tão intenso que ele viu ele ele ele ele e além. Ele
viu o Grande Ser. E era só o Grande Ser que existe. Só. Então para quê sentir
medo da morte? Sentir medo?
Ao praticar o ascetismo cuidado
para não machucar-se por vaidade. Quando vê, além do corpo machucado você está
com o ego enorme. Justamente o contrário do que devia ser: corpo em paz e
humildade.
Feche os olhos, pare, respire
devagar, deixe o exterior virar interior virar exterior e... E as imagens são
belas: “a pulsação da vida infinita e universal atravessando o seu corpo com o
seu sangue”, “você cria um mar de Amor e depois convida todas as pessoas do
mundo a nadar” e “o lago da paz transborda em um dilúvio inesquecível”.
Agora
é a parte dos livros que vocês vão comprar para mim.
(Se
eu tivesse que escolher, supondo que eu tivesse que escolher e supondo também
que houvesse uma diferença... Eu escolheria, entre zen-budismo e a ioga, o
zen-budismo. Mas aí reparo que na bibliografia comentada e na bibliografia
geral, eu destaquei mais livros no capítulo “Ioga e a Tradição Hindu” do que no
capítulo “Zen-Budismo”. Por quê? Não sei. Mistério! E que bom que terminamos
com um mistério. Nada de respostas prontas e finais no final aqui. Que bom que
terminamos com um mistério.)
Aphorisms
of Ioga by Bhagwan Shree Patanjali,
organizado por Swami Purohit (1938,
Editora Farber, Londres).
The
Sciense of Ioga, de I.K.
Taimni (1961, Editora Quest).
Yoga
and Beyond, de Jeanine
Miller e G. Feuerstein (1972,
Editora Schocken, Nova Iorque).
All
Men are Brothers, de M.
Gandhi (1958, UNESCO, Paris).
The
Yellow Book, de Hari
Dass (1973, Lama Foundation, San Cristobal, Novo Mexico).
Ramakrishna: Prophet of New India, de
Swami Nikhilananda (1948, Editora
Harper & Row, Nova Iorque).
Ramana Maharshi and the Path of Self-Knowledge, de
A. Osbourne (1970, Editora Weiser, Nova Iorque).
Sayings
of Sri Ramakrishna, de
Ramakrishna (1965, “Madras, India:
Sri Ramakrishna Math.”)
The
Religions of Man, de H.
Smith (1958, Editora Harper & Row, Nova Iorque).
Metaphysical
Meditations, de Paramahansa
Yogananda (1967, Editora Self-Realization Fellowship, Los Angeles).
Saying
of Yogananda, de
Paramahansa Yogananda (1968, Editora
Self-Realization Fellowship, Los Angeles).
Spiritual
Diary, de Paramahansa
Yogananda (1969, Editora Self-Realization Fellowship, Los Angeles).
The
Autobiography of a Yogi, de Paramahansa Yogananda (1972, Editora Self-Realization Fellowship,
Los Angeles).
Livremente inspirado em “Segunda
Parte Introdução às Teorias Orientais da Personalidade” e capítulo 11 “Ioga e a
Tradição Hindu”. Do livro Teorias
da Personalidade, de James Fadiman e Robert Frager
(Traduções de Camila Pedral Sampaio e Sybil Safdié; com a
coordenação de Odette de Godoy Pinheiro, 1979, São Paulo, Editora:
Harbra Editora Harper & Row do Brasil Ltda).