quarta-feira, 31 de março de 2021

31 de março de 2021

 


Uma abelha tentando fazer o seu trabalho, enquanto um mamífero curioso a interrompe. Rio Acima, 2010.

Ontem fiquei sabendo do inesperado "encantamento" do escritor e psicanalista Contardo Calligaris. Fui tomado por memórias queridas imediatamente. Entre meados de 1999 e 2002, minha família assinou o jornal Folha de S. Paulo. E foi nessa época que comecei a montar meu arquivo de material jornalístico. O que incluía os artigos de autoria de Contardo Calligaris. Bom senso e muita inteligência, além, claro, do indefinível prazer de um pré aborrecente descobrindo um mundo novo.

Além de artigos do Contardo Calligaris eu tinha selecionado artigos de outros autores e de repente ocorreu-me que eu poderia usar eles para ajudar a fazer o meu blog ser diário. Eu leio rápido e artigos e textos semelhantes poderiam ser mais fáceis para eu comentar. Quem sabe? Não sei se vai dar certo, mas sei por qual autora começar. Enquanto isso, eu preparo os comentários de livros.

segunda-feira, 29 de março de 2021

29 de março de 2021

 


Minha prima materna Alícia e uma amiga. Rio Acima, 2010. Aniversário de minha mãe ou de meu pai, não lembro. Sou tão sociável quanto minha casa e minha família. Acho que é mais provável que seja aniversário de minha mãe mesmo. Aproveitar para mandar um abraço para minha prima Norly, mãe da Alícia. A amiga da Alícia segura uma boneca que esta tentando dizer para eu tentar mais uma vez investir na fotografia.


Vou tentar fazer as postagens deste blog serem sempre no domingo, na segunda e na quinta. Acho que é uma regularidade razoável até para um preguiçoso cabeça de vento como eu.


As próximas obras literárias a serem analisadas por aqui incluem “Carta a Meneceu”, do Epicuro; “A Conferência dos Pássaros”, do Farid Ud-Din Attar; além de uma surpresa. Além de voltar a escrever sobre o meu arquivo de material jornalístico. Então não saiam daí e me acompanhem. Ah, claro, o eixo principal desta primeira fase continua sendo o Joaquim Maria Machado de Assis. Mas agora serão os seus cinco principais romances.


domingo, 28 de março de 2021

Missa do Galo, 1899

 

Missa do Galo” (Páginas Recolhidas, 1899)


Sim, o conto de Machado de Assis Missa do Galo” faz por merecer toda toda fama que possui.


Pelo sorriso da Kalki Koechlin!, ainda bem que a leitura de “Missa do Galo” não foi o que eu esperava! Não foi bom, não foi ruim, foi… um vento…?

Na verdade eu não sei o que ela foi. A metáfora a imagem mais tradicional aqui seria a de um “tapa na cara”; mas isso poderia sugerir agressividade que deixa marca na pele. A marca deixada não foi na pele.

Ah… Não foi bom, não foi ruim, foi… um vento. Foi… Foi a Penélope Cruz em lágrimas naqueles seus olhinhos perfeitinhos sobre aquele breve breve instante em que “o Amor verdadeiro pareceu possível” [“Vanilla Sky” (“Vanilla Sky”, Penélope Cruz, Cameron Diaz, 2001, Cameron Crowe, Alejandro Amenábar, Mateo Gil, Tom Cruise, Kurt Russell, Jason Lee etc.) {*} ]. E também foi o meu vovô materno Valdir lamentando a sua solidão para mim e eu não percebendo a tempo (mas isso foi muito antes de 2017 e antes de 2017 eu conseguia ser ainda mais idiota do que eu sou agora).

Ler “Missa do Galo” não foi bom, não foi ruim, foi um vento. Foi uma possibilidade, uma chance, uma escolha, uma bifurcação, e um “e se...”. E o maior milagre do Universo, - a nossa vida -, é pouco mais do que isso. Eu espero que você já saiba disso. Espero mesmo.


“— Não! qual! Acordei por acordar.

Fitei-a um pouco e duvidei da afirmativa. Os olhos não eram de pessoa que acabasse de dormir; pareciam não ter ainda pegado no sono. Essa observação, porém, que valeria alguma coisa em outro espírito, depressa a botei fora, sem advertir que talvez não dormisse justamente por minha causa, e mentisse para me não afligir ou aborrecer. Já disse que ela era boa, muito boa.

Não quero parecer caliente, - pode ter alguém entendido de Freud lendo-me, internet é coisa traiçoeira- , mas a vontade que tenho é de chamar o Nogueira de tapado. Ou, indo mais longe até os braços da heresia mais imperdoável, dizer que Machado de Assis errou flagrantemente na coerência criando um narrador-personagem tão observador sagaz e ao mesmo tempo tão ingênuo. Mas é claro que não é o caso: Machado de Assis não erra e eu estou mesmo a sonhar com uma Conceição, empoderada e experiente, a perguntar-me pertinho pertinho de meu ouvido porque gosto de ler Paulo Mendes Campos e notas de rodapé em livros de filosofia

Quanta bobagem para fazer propagando de uma obra-prima, Aldrin! É a neblina de sugestões e ambiguidades cobrindo aqueles personagens, aquela sala naquela noite, impedindo-me também a mim de fazer uma observação inteligente aqui. Então, leitoras e leitores; vocês me acompanham nas leituras e releituras? Não é justo que apenas Nogueira e eu fiquemos com cara de bobo naquela sala do escrivão Meneses, à espera de um ano novo a curar a solidão de corações em chamas.



* Parece que “Vanilla Sky” é uma versão hollywoodiana de “Preso na Escuridão” (“Abre los Ojos”, Penélope Cruz, 1997, Alejandro Almenábar, Mateo Gil e etc.). Conheço “Vanilla Sky” e gosto do filme, não só pelos olhinhos da Penélope, mas por causa também do roteiro. Pesquisando os créditos para este texto, descobri esse “Abre los Ojos”. Parece-me bom, também porque ao continuar a pesquisa descobri que Alejandro e Mateo dirigiram e escreveram dois outros filmes que também me pareceram muito interessantes: “Alexandria” (“Agora”, Rachel Weisz, 2009, Alejandro Almenábar, Mateo Gil, Oscar Issac e etc.) e “Mar Adentro” (“Mar Adentro”, 2004, Javier Bardem, Alejandro Almenábar, Mateo Gil e etc.). Antes de terminar esta nota de rodapé, um instante para a justiça cultural. O Kurt Russell e o Jason Lee estão maravilhosos em “Vanilla Sky” e a crítica especializada não costuma olhar para esses dois como sendo bons atores. Bom bom, em “Vanilla Sky” eles estão ótimos; principalmente o Kurt.

Ah!, Ah!, quase me esqueci!!!! Escrevi que “Vanilla Sky” é uma versão hollywoodiana de “Abre los Ojos”; bom, queria falar mais sobre isso. Hollywood também fez uma versão do maravilhoso perfeito majestoso inesquecível inimitável insuperável e il magnifico “Deixe Ela Entrar” (“Låt den rätte komma in”, Lina Leandersson, 2008, Tomas Alfredson, John Ajvide Lindqvist, Kåre Hedebrant e etc.). Lembro-me que assisti a esta joia por acaso, quando a TV Cultura passava filme bom em horário nobre. Foi há muitos anos. Eles passavam um filme de ficção não muito comercial às 22 horas e na mesma semana passavam um documentário. Sobre os documentários lembro de um episódio curioso de guerra de propaganda. Uma vez eles passaram um documentário sobre a Leila Khaled e na semana seguinte eles passaram um documentário sobre o Holocausto na Segunda Guerra Mundial. Acho curioso essas coisas de guerra de propaganda, embora a leitora e o leitor aí do outro lado do monitor deve estar achando essas minhas observações coisa de aborrecente; dada a gravidade dos assuntos tratados. Vai ver é uma auto defesa minha parte diante de um mundo cronicamente violento.


Faltou ainda dizer mais uma coisa. Escrevi grande parte deste texto sobre “Missa do Galo”, do Machado de Assis, escutando sem parar Ennio Morricone e sua música tema para “A Missão” (“The Mission”, Cherie Lunghi, 1986, Roland Joffé, Robert Bolt, Robert De Niro, Jeremy Irons e etc.).

quinta-feira, 25 de março de 2021

Trio em Lá Menor, 1896

 

Trio em Lá Menor” (Várias Histórias, 1896)


Então, leitoras e leitores; vocês sabem? Você sabe? Não se torce pelo Atlético ou pelo Cruzeiro, se prefere ouvir Beatles ou Rollins Stones, se gosta de muita farofa ou de muita muita farofa, ou se acha graça nas piadas do Monty Python ou se você é uma pessoa que-não-acha-graça-no-humor-do-Monty-Python-logo-você-seria-uma-pessoa-chata-demais-o-que-faz-aqui-no-meu-blog-cai-fora-agora. Não, não! Eu quero saber se você sabe que dentro do seu peito há uma ou duas estrelas. É, igual a Maria Regina. Mas nem a Maria Regina sabia o que ela tinha. É difícil saber, mesmo porque de longe as duas estrelas podem parecer apenas uma por causa da distância e brilho. Muito difícil. Machado de Assis sabia. Mas não conta, porque Machado é Machado e ele sabe tudo mesmo. Nós, poeira efêmera, por outro lado; ficamos na ignorância se somos uma estrela solitária em um canto de um universo infinito e infinito também em indiferença, ou se a solidão nossa é na forma de uma dança cega entre duas estrelas. Enquanto isso sonhamos, se tivermos coração forte, não com ouro, mas sim com respostas às nossas perguntas.


Buscamos em nossa caminhada os alvos de nossos desejos e interesses. Se a leitora ou o leitor aqui for mais idealista, sinta-se livre para usar o termo “sonhos”.

Quem já assistiu a “O Discreto Charme da Burguesia” (“Le charme discret de la bourgeoisie”, 1972, Luis Buñuel, Jean-Claude Carrière e etc.), deve se lembrar, - até por influência de comentários prévios -, da sua cena mais famosa. A cena do jantar. Bom bom, também gosto desta cena. E cito o livro atraente “Minhas Mulheres e Meus Homens”, de Mario Prata; onde é contada uma história de bastidores entre Buñel e Carrière a respeito desta cena. Uma história comovente que termina no hospital e com um beijo. Leiam Mario Prata. Bom bom, mas não considero, filosoficamente, a cena do jantar a mais importante cena de “O Discreto Charme da Burguesia”. A mais importante cena para mim deste filme é outra. Muito repetida, inclusive. Os personagens correndo desorientados por uma estrada. Então, leitora ou leitor aqui deste blog; você esta correndo cegamente e sem parar em uma estrada? Ou já achou os pontos cardeais em sua vida?


A verdade pede que diga que esta moça pensava amorosamente em dois homens ao mesmo tempo, um de vinte e sete anos, Maciel — outro de cinqüenta, Miranda. Convenho que é abominável, mas não posso alterar a feição das coisas, não posso negar que se os dois homens estão namorados dela, ela não o está menos de ambos. Uma esquisita, em suma; ou, para falar como as suas amigas de colégio, uma desmiolada. Ninguém lhe nega coração excelente e claro espírito; mas a imaginação é que é o mal, uma imaginação adusta e cobiçosa, insaciável principalmente, avessa à realidade, sobrepondo às coisas da vida outras de si mesmas; daí curiosidades irremediáveis.

Alma feminina, narrador conversando com as leitas e leitores que se sentem cúmplices no ato de conhecer sem preconceitos esses personagens e suas histórias, um espelho sincero para conhecermos a nós mesmos, uma história bonita e profunda, um óculos (ou microscópio ou luneta) para conhecermos o mundo verdadeiro. Mais um conto de Machado de Assis, apenas. E isso é tanto tanto... E cada vez mais, quando a gente o relê! E só estamos começando aqui.


Na próxima postagem vamos descobrir o último conto de Machado de Assis de minha antologia de 17 contos dele. Justamente aquele conto que é o mais celebrado. A ordem cronológica coincidiu com o gosto de leitores e críticos; mas será que (****) faz por merecer essa fama toda?

terça-feira, 23 de março de 2021

Entre Santos, 1896

 

Entre Santos” (Várias Histórias, 1896)


O parentesco aqui não é com outro conto de Machado de Assis e sim com uma história do Novo Testamento: perdoo-te, mas agora vá e não peque mais; não entre numa igreja para mentir. Apesar da lição tão pesada de que não devemos mentir, ou pelo menos, tentar evitar mentir; é divertido imaginar que à noite nas igrejas os santos fiquem fazendo fofocas sacras a respeito dos fiéis que a frequentaram. Não minta, porque não adianta e você não precisa. Ah, sim; claro, lembrando o óbvio aqui: a descrição psicológica das histórias narradas no conto “Entre Santos” revelando mais uma vez a profundidade do conhecimento da alma humana que Machado de Assis possuía. Porque a pior mentira é a que você conta para… Para…. Você mesmo.


“— Que pessoa?

Uma pessoa mais interessante que o teu escrivão, José, e que o teu lojista, Miguel…

Pode ser, atalhou S. José, mas não há de ser mais interessante que a adúltera que aqui veio hoje prostrar-se a meus pés. Vinha pedir-me que lhe limpasse o coração da lepra da luxúria. Brigara ontem mesmo com o namorado, que a injuriou torpemente, e passou a noite em lágrimas. De manhã, determinou abandoná-lo e veio buscar aqui a força precisa para sair das garras do demônio. Começou rezando bem, cordialmente; mas pouco a pouco vi que o pensamento a ia deixando para remontar aos primeiros deleites. As palavras paralelamente, iam ficando sem vida. Já a oração era morna, depois fria, depois inconsciente; os lábios, afeitos à reza, iam rezando; mas a alma, que eu espiava cá de cima, essa já não estava aqui, estava com o outro. Afinal persignou-se, levantou-se e saiu sem pedir nada.

Melhor é o meu caso.”

Melhor que isto? perguntou S. José curioso.

Não há mesmo muita coisa a comentar sobre o conto profundo “Entre Santos”. Mas devo citar um trecho que nem é o mais sofisticado quanto à anatomia do coração, e lembrar também quanto é frequente as narrativas fantásticas em Machado de Assis. Eu supunha-o um escritor mais realista quanto aos seus enredos. Acho que isso vale mais para seus romances. Nos contos Machado de Assis sentia-se mais livre para criar? Parece que sim. Interessante. Ousaríamos concluir daí que se Machado estivesse aqui batendo um papo com a gente in loco ele poderia nos confessar que preferia os seus contos? Quem sabe? Vai ver alguma biografia, alguma carta pudesse esclarecer essa questão. Por enquanto estou lendo alguns de seus textos mais importantes, biografias e a fortuna crítica será de meu interesse mais acurado mais tarde.

segunda-feira, 22 de março de 2021

Um Homem Célebre, 1896

 

Um Homem Célebre” (Várias Histórias, 1896)


Família é coisa grande mesmo, temos aqui outro parentesco entre contos de Machado de Assis. “Um Homem Célebre” é parente de “Cantiga de Esponsais”. Trabalhar humildemente; trabalhar humildemente; uma ponte ora grande ora curta e sempre marcante para um artista entre o público e os seus desejos; trabalhar humildemente; trabalhar humildemente é a resposta. Mas humildade não prescinde de um pouco do doce humor e da amarga ironia. Que registremos, então para todos lembrarem bem, que Pestana fez aquela piada e aquela piada de despedida foi na medida, na medida. Não a classifiquemos de “vingança”, isso seria desagradável demais para com o personagem, vamos dizer “na medida” mesmo. Mas apesar da vontade de uma interpretação agradável, temos que admitir que o Mestre Romão foi mais feliz que o Pestana, porque pelo menos escutou o assovio daquela vizinha recém casada no final. O poder de uma obra de arte.


Lembram que eu observei que o “Conto de Escola” era, apesar de outras qualidades, pobre do ponto de vista psicológico? Bom, não posso dizer o mesmo de “Um Homem Célebre”. Aqui conhecemos a intimidade de um artista em conflito entre o que ele quer e o que o público quer. Uau! É para citar a cena inicial de “O Mundo de Andy” (“Man on the Moon”, Courtney Love, 1999, Jim Carrey, Milos Forman, Larry Karaszewski, Scott Alexander e etc.) e a cena final de “O Sol de Cada Manhã” (“The Weather Man”, Hope Davis, 2005, Gore Verbinski, Nicholas Cage, Steve Conrad, Michael Caine e etc.)? É sim. Depois de decidir contar piadas para a parede do seu quarto ou para o público, lembrar-se pelo menos de ficar na frente do balão do Bob Esponja durante o desfile de Ação de Graças. Se você não conseguir harmonizar as suas necessidades de artista com o que a plateia quer; pelo menos lembre-se de ganhar dinheiro para a comida. É possível. Antônio Mazzaropi e William Shakespeare são exemplo de dois artistas que eram autorais e eram razoavelmente seguros quanto ao dinheiro.


E já que estamos falando de riquezas, o conto “Um Homem Célebre” é rico do ponto de vista sociológico. Tudo bem que neste conto Machado de Assis está olhando para classes abastadas de 1870, mas mesmo assim é difícil imaginar noites do Rio de Janeiro embaladas por polcas e quadrilhas ao piano. Paralelo ambíguo entre músicas populares e política, algo meio óbvio talvez. E uma lição nem tão óbvia: cuidado com os escrivães dos cartórios: eles podem fazer fofocas venenosas!


O editor achou-a linda.

Vai fazer grande efeito.

Veio a questão do título. Pestana, quando compôs a primeira polca, em 1871, quis dar-lhe um título poético, escolheu este: Pingos de Sol. O editor abanou a cabeça, e disse-lhe que os títulos deviam ser, já de si, destinados à popularidade, ou por alusão a algum sucesso do dia, — ou pela graça das palavras; indicou-lhe dois: A Lei de 28 de Setembro, ou Candongas Não Fazem Festa.

Mas que quer dizer Candongas Não Fazem Festa perguntou o autor.

Não quer dizer nada, mas populariza-se logo.

Pestana, ainda donzel inédito, recusou qualquer das denominações e guardou a polca, mas não tardou que compusesse outra, e a comichão da publicidade levouo a imprimir as duas, com os títulos que ao editor parecessem mais atraentes ou apropriados. Assim se regulou pelo tempo adiante.

Gostei do conto “Um Homem Célebre”. Olho para o meu umbigo, suspiro diante de alguns vícios e fraquezas de minha parte. Estes textos aqui elogiam o talento de Machado de Assis? Acho que sim. Pingos de Satisfação.

domingo, 21 de março de 2021

Conto de Escola, 1896

 

Conto de Escola” (Várias Histórias, 1896)


Conto de Escola” é parente do conto “Noite de Almirante”: simplicidade; simplicidade; somos humanos e é justo e esperado que o nosso sangue ferva as vezes, mas devemos ser simples; simplicidade; simplicidade. Mas Seu Pilar teve mais sorte que o Deolindo; pois a música, pois aquele dia lindo, as calças novas e amarelas dadas pela mãe, os fuzileiros marchando; tudo tudo isso tornava mais fácil deixar voar e cicatrizar um coração machucado…


Conto da Escola”, um dos contos mais populares de Machado de Assis sendo um dos campeões de presença em antologias diversas, é muito rico do ponto de vista sociológico. Meados do século XIX. Professor que fuma rapé na sala de aula e fica lendo jornal enquanto os alunos estudam a lição. E que, as vezes, de acordo com sua preferência política em paralelo com o que lia no jornal do dia, a lição e a palmatória poderiam ser mais ou menos doloridas aos seus alunos. Se no início do conto o narrador quer nos informar que estamos em 1840, na segunda folha somos informados também que a agitação pública era grande dado que o Brasil vivia o “fim da Regência”. Com 14 anos o Dom Pedro II vai ou não vai governar? Agora é interessante pensar em uma questão mais atual deste nosso Brasil do ano de 2021: a “Escola Sem Partido”. Lendo o “Conto da Escola” podemos concluir que como Brasília nos decepciona com regularidade triste, não faz muita diferença professores liberais ou socialistas e sim se estes mesmos professores são ou não são bem humorados. Pode parecer bobagem, mas a felicidade já foi definida como sinônimo de “insensibilidade”. O ideal seria que as escolas fossem uma ilha longe de Brasília…?


De repente, olhei para o Curvelo e estremeci; tinha os olhos em nós, com um riso que me pareceu mau. Disfarcei; mas daí a pouco, voltando-me outra vez para ele, achei-o do mesmo modo, com o mesmo ar, acrescendo que entrava a remexer-se no banco, impaciente. Sorri para ele e ele não sorriu; ao contrário, franziu a testa, o que lhe deu um aspecto ameaçador. O coração bateu-me muito.

Precisamos muito cuidado, disse eu ao Raimundo.

Diga-me isto só, murmurou ele.

Conto de Escola” pareceu-me muito muito familiar. Teria sido lido por mim nos tempos de colégio ou o palco do conto, uma sala de aula, está sendo usado pela minha memória para enganar o meu coração enamorado pelo universo de Machado de Assis? Eu não sei. É um bom conto, facilmente favorito para o nosso gosto popular; mas do ponto de vista psicológico não é tão tãããão poderoso.

sexta-feira, 19 de março de 2021

O Enfermeiro, 1896

 

O Enfermeiro” (Várias Histórias, 1896)


São dezessete contos e “O Enfermeiro” é o décimo segundo conto clássico de Machado de Assis que escrevo a respeito aqui. Mais da metade, portanto. Acho que é hora de, - como se diz popularmente -, “fazer uma d.r.”. Discutirmos a nossa relação.

Melancolia, Saturno em conflito com a Lua que rege o meu signo; depressão, algum hormônio errado ou algum príon na minha cabeça ou vagabundagem mesmo. Ou perda de fé em mais algum sonho que sonhei. Não importa. Ando esgotado, cansado. Então vou direto ao ponto: não adianta perguntar quem é você que me lê. Você não saberia responder. Ninguém sabe. Ninguém sabe o que se é, o que é triste porque conhecer-se é mais da metade do caminho para a felicidade. Então de uma vez pergunto logo algo mais em harmonia com o conto “O Enfermeiro”: como você domesticou sua consciência depois de… hum… ter feito algo grave? Porquê podemos escapar de todos, menos de quem mora no espelho para a gente.


Paralelo com algum filme? Sim, eu tenho um. Não é top 20 de minha lista de filmes favoritos de todo o universo e eternidade, mas é um filme que gosto muito. E justiça cultural, ele reúne nomes subestimados pela crítica especializada em cinema em atuações excelentes. O filme “Sem Dor, Sem Ganho” (“Pain & Gain”, Bar Paly, 2013, Michael Bay, Christopher Markus, Stephen McFeely, Pete Collins, Mark Wahlberg, Dwayne Johnson, Anthony Mackie, Tony Shalhoub, Ed Harris, Rob Corddry e etc.). A espiral trágica em os personagens perdidos caem aos poucos e como eles não conseguem perceber… É incrível como o filme narra isso!

Note o “aos poucos”. Isso é fundamental. Porque o demônio não vai aparecer para você com uma mãos segurando uma caneta e na outra um contrato. Claro que não, seria fácil demais. Você sentiria o calor, o cheiro de enxofre, alguns efeitos especiais e aí sairia correndo… Não poderia ser assim tão fácil e simples. É um erro de cada vez, de cada vez para montar o quebra-cabeça da tragédia. Todos os pedaços são inocentes e bobos… O segredo então seria prestar a atenção.


Prestar a atenção. Henry Thoreau em seu livro cruelWalden” conta que a vida nossa é eminentemente moral, com o vício e a virtude em nós em conflito 24 horas por dia. Isso muitos anos antes de Freud. Como prestar a atenção 24 horas por dia? Numa hora nos distraímos e aí… Procópio, o enfermeiro do conto “O Enfermeiro” de Machado de Assis, estava quase abandonando o emprego, foi só um momento de raiva e aí… A resposta clássica, aqui, seria o hábito. Não temos como prestar a atenção 24 horas por dia para não deixar o vício vencer, mas se tivermos bons hábitos cada vez mais sólidos em nós; temos uma proteção excelente. Militares e religiosos são um exemplo excelente. Atenção e disciplina.


E eu? Um atraso de praticamente uma semana aqui no blog. Por quê? Perdeu a graça? Auto sabotagem? Vagabundagem? Se eu cuidasse de um farol, abandonado em uma ilha deserta. (Como tantas vezes imagino-me e sonho). Talvez eu ficasse depois de alguns dias apenas deitado na areia, até transformar-se em mais um grão minúsculo. E como eu suporto isso, como convenço-me que é normal isso? Porque aparentemente não estou lutando para mudar isso criando hábitos produtivos. Sei lá. Não presto a atenção.


Qual austero! Já morreu, acabou; mas era o diabo.

E referiam-me casos duros, ações perversas, algumas extraordinárias. Quer que lhe diga? Eu, a princípio, ia ouvindo cheio de curiosidade; depois, entrou-me no coração um singular prazer, que eu sinceramente buscava expelir. E defendia o coronel, explicava-o, atribuía alguma coisa às rivalidades locais; confessava, sim, que era um pouco violento... Um pouco? Era uma cobra assanhada, interrompia-me o barbeiro; e todos, o coletor, o boticário, o escrivão, todos diziam a mesma coisa; e vinham outras anedotas, vinha toda a vida do defunto. Os velhos lembravam-se das crueldades dele, em menino. E o prazer íntimo, calado, insidioso, crescia dentro de mim, espécie de tênia moral, que por mais que a arrancasse aos pedaços recompunha-se logo e ia ficando.

Estou lendo os 17 contos selecionados em ordem cronológica de como eles foram publicados em livros. Uma maneira de acompanhar o amadurecimento do Machado de Assis. Bom, se antes poderíamos duvidar apesar de aqui e ali o brilho do gênio era inconfundível; com “O Enfermeiro” não há dúvida de que o amadurecimento é completo. Um dos seus melhores contos. Fala sobre culpa e morte e é, ao mesmo tempo, um dos seus contos mais engraçados: o trecho sobre os palavrões, por exemplo, é impagável. E é muito muito rico quanto aos detalhes sociológicos: preconceito contra alcoólatras, tu vai ficar indo atrás das minhas escravas mais bonitas?, amigo padre dando uma instrução basicamente informal mas suficiente para um bom emprego, a hipocrisia de uma sociedade que espera o sujeito dar as costas e… Muito rico. Realmente um dos melhores contos do nosso Machado.

sexta-feira, 12 de março de 2021

A Causa Secreta, 1896

 

A Causa Secreta” (Várias Histórias, 1896)


Um preâmbulo.

"Entre eles, o da agressividade que se dirige para fora, que depois viria a se chamar "sadismo", e o daquela que se volta para dentro, agora denominada “masoquismo”. (Na mesma época em que Nietzsche escrevia, um outro precursor de Freud, Machado de Assis, publicou o conto “A causa secreta”, talvez o melhor estudo sobre o sadismo que há na literatura mundial.)".

[Professor Paulo César de Souza no posfácio para a sua tradução escrupulosa de Genealogia da Moral – Uma Polêmica”, de Friedrich Nietzsche (Editora Companhia das Letras, 2008, São Paulo, São Paulo). Ainda não li este livro do meu Frederico, o Profeta Bigodudo. Mas assim como alguns dos outros livros de Nietzsche da Editora Companhia das Letras eu li os posfácios do professor Paulo, além de saborear algumas de suas notas de fim de capítulo. Adoro notas de rodapé e notas de fim de capítulo.]

Na antologia que montei de contos do Machado de Assis que eu leria e aqui faria comentários, fiz questão de colocar “A Causa Secreta” justamente por causa do trecho acima. Valeu a pena? Ah…


Antes de mais nada o óbvio: levanta a mão aí do outro lado do monitor quem não acreditou que o Fortunato não sabia da doença da Maria Luísa? Pedindo ajuda à sabedoria de psicólogos e psicanalistas: como Fortunato podia ser tão trabalhador e abnegado ao mesmo tempo que? E o Garcia? Quem acredita que ele era tão inocente e passivo a respeito de todo o drama que acontecia?


Sadismo. Hum… Antes da chegada da dominatrix, das cordas, botas pontiagudas, cremes quentes, e algemas e gemidos que não importa mais se são de prazer ou dor; vamos começar formalmente: pedindo ajuda ao dicionário: sentir prazer ao causar dor ao parceiro, sentir prazer diante do sofrimento do outro. Hum… Hum… Mas já? Já vão abandonar meu blog para lerem vocês mesmos a “Causa Secreta”? Mas já? Danadinhos, danadinhos… Fiquem só mais um pouco, por favor! Prometo que eu vou ser breve. Prometo que vai ser gostoso. Vai doer e vai ser gostoso.


E nojento também. Ah, a natureza humana, a natureza humana… Porque na cultura pop eu detectei algumas causas secretas.

Por quê o personagem óleo negro infectante era tão popular na série “Arquivo-X” (The X-Files, Gilliam Anderson, David Duchovny, Chris Carter, 1993-2018 e etc.)? Óleo negro infectante entrando pelos olhos, ouvidos, nariz, entrando pela boca… E todo mundo assistindo, sem desgrudar os olhos da televisão...

Qual é o segredo da popularidade do FaceHugger, da série de filmes “Alien”?

Qual é a cena mais famosa do filme “[REC]” (“[REC]”, Manuela Velasco, 2007, Jaume Balagueró, Paco Plaza, Luiso Berdejo e etc.)? Essa mesma: a do beijo com o verme. Agora: por quê? E no filme “[REC] 4 Apocalipse” (“[REC] 4 Apocalipsis, Manuela Velasco, 2014, Jaume Balagueró, Manu Díaz, etc.) também temos um outro beijo com verme. Por quê? Por quê?

No filme “Alien vs. Predador 2” (“Aliens vs Predator – Requiem”, Victoria Bidewell, 2007, Colin Strause, Greg Strause, Shane Salerno, Dan O'Bannon, Ronald Shusett, Jim Thomas, John Thomas e etc.), qual é a cena mais popular? Até eu tenho vergonha de dizer qual é, mas dei uma pista ao escrever os créditos. Por quê é assim?

E no filme “A Morte do Demônio” (“Evil Dead”, Jane Levy, 2013, Fede Alvarez, Rodo Sayagues, Sam Raimi e etc.), qual é a cena mais famosa? Haja tomate e liquidificador! Imagino a coitada da atriz que ficava do lado debaixo durante os ensaios para a cena.

Daniel Defoe e o seu livro “Um Diário do Ano da Peste” (1722). Há ali o trecho sobre o beijo da morte. Não é o trecho mais inesquecível do livro? Por quê?

Ah, claro. Sem mencionar como as pessoas viram zumbis nos filmes de zumbis. Sem mencionar também os parasitas nos videogames. E já que falamos em “beijo da morte”, o que não falta em alguns videogames são beijos mortais, beijos que retiram a força vital dos personagens. E os vampiros! Como posso ter esquecido dos vampiros nesta lista aqui? É sadismo ou poder? Sadismo é política sem terno e gravata, assim como dizem que “a guerra é o capitalismo sem luvas”?


Verdade é que Fortunato não curou de mais nada, nem então, nem depois. Aberta a casa, foi ele o próprio administrador e chefe de enfermeiros, examinava tudo, ordenava tudo, compras e caldos, drogas e contas. Garcia pôde então observar que a dedicação ao ferido da Rua D. Manoel não era um caso fortuito, mas assentava na própria natureza deste homem. Via-o servir como nenhum dos fâmulos. Não recuava diante de nada, não conhecia moléstia aflitiva ou repelente, e estava sempre pronto para tudo, a qualquer hora do dia ou da noite. Toda a gente pasmava e aplaudia. Fortunato estudava, acompanhava as operações, e nenhum outro curava os cáusticos.

Tenho muita fé nos cáusticos, dizia ele.

Acho bom esclarecer que eu não gosto e não assisto a filmes de terror, deixei de assistir à série “Arquivo-X” (The X-Files, Gilliam Anderson, David Duchovny, Chris Carter, 1993-2018 e etc.) muitos anos antes do personagem óleo negro infectante aparecer e eu nunca em minha vida fui íntimo de videogames. E não fiz uma pesquisa específica para este texto. Onde então eu consegui os exemplos citados? É suficiente para você dizer que eu gosto do site YouTube? É verdade e como diz a sabedoria popular: quem se explica demais se complica. Eu gosto do YouTube e pronto e ficamos por aqui. A culpa, portanto, Freud e Sade, é do algoritimo do YouTube. Ah, os algoritmos de internet...


Vai estragar o clima do final do texto, mas não importa. É um dos meus filmes favoritos, top 10 de todos os tempos e merece este meu sacrifício. Aliás, sinto prazer em fazer este sacrifício… Mencionei que é estranho que Fortunato seja um médico tão dedicado e corajoso apesar de… Bom, no filme “O Cubo” (“Cube”, Nicole de Boer, 1997, Vincenzo Natali, André Bijelic, Graeme Manson e etc.), temos uma personagem que também é médica (se não me falha a memória). O paralelo ocorreu-me porque a personagem Holloway, ao mesmo tempo que é solidária na profissão, tem obsessão pelas suas joias e é o que ela mais lamenta ter perdido no início do filme. Dessa cena eu lembro bem. Achei curioso que uma mulher que faz serviço “tão social” ao mesmo tempo ser tão vaidosa e materialista. É fácil demais a avaliação de que Holloway e Fortunato são personagens contraditórios. É pensar que os dois não são contraditórios é que faz o diagnóstico ficar mais interessante. E mais gostoso também.


Pronto; agora podem ir ler “A Causa Secreta”, mais um conto perfeito do Machado de Assis. Não se preocupem com o trecho sobre o rato. Vocês não vão ter pesadelos com o trecho sobre o rato. Eu juro. Confiem em mim.

quarta-feira, 10 de março de 2021

A Cartomante, 1896

 

A Cartomante” (Várias Histórias, 1896); Machado de Assis


Tem, tem mais coisa nesse trem. Ou para misturar expressões populares de Minas Gerais e a atmosfera dos romances de mistério de Agatha Christie: há mais coisa entre um vagão de trem e outro vagão de trem do que costumamos sonhar.

Antes de mais nada nos perguntamos se o atraso de Camilo ao encontro com Vilela fez alguma diferença para o desfecho trágico. Em se tratando de paixão, é possível. Mas aqui já começam os detalhes e sentidos que escapam por entre os dedos da nossa razão: atraso por causa da cartomante ou por causa da carroça no meio da rua? Em linguagem da filosofia técnica: qual foi a Causa Primeira ou, pelo menos, a Causa Eficiente?(*) E quem mandava as cartas anônimas? “Bobagem! Olhe novamente como a Rita comportava-se. Praticamente uma garota ingênua, apesar de sua idade! Acha que ela seria capaz de disfarçar por tanto tempo assim?”; alguma leitora ou leitor mais vivido e experiente poderia observar. E eu dou a minha contribuição pessoal à investigação: “se formos pelo caminho da magia da cartomante (não podemos esquecer, afinal de contas, o título que o autor decidiu dar ao conto), o meu palpite é a hora das passas e do pagamento de Camilo. Não posso ignorar que o Mestre das Sutilezas e Ambiguidades; - que é o nosso Machado de Assis -; quando escreve “Os olhos da cartomante fuzilaram” queria dizer mais coisa do que simplesmente descrever uma cartomante gananciosa. Não, ela se sentiu humilhada e ofendida pela generosidade mal calculada e ainda por cima prejudicada por aquela fala inicial do Camilo. O segredo esta ali.


Os olhos da cartomante fuzilaram.”

Os olhos da cartomante fuzilaram.”

Os olhos da cartomante fuzilaram.”

Os olhos da cartomante fuzilaram.”

Tem que ser aqui, tem que ser neste instante. Esse é o momento chave de mais um conto maravilhoso de Machado de Assis. É o décimo dos contos que escolhi para ler e é mais uma joia.


Realmente, era graciosa e viva nos gestos, olhos cálidos, boca fina e interrogativa. Era um pouco mais velha que ambos: contava trinta anos, Vilela vinte e nove e Camilo vinte e seis. Entretanto, o porte grave de Vilela fazia-o parecer mais velho que a mulher, enquanto Camilo era um ingênuo na vida moral e prática. Faltava-lhe tanto a ação do tempo, como os óculos de cristal, que a natureza põe no berço de alguns para adiantar os anos. Nem experiência, nem intuição.

Aconteceu em “Uns Braços” e aconteceu novamente em “A Cartomante”. Fico preocupado, não só porque a atmosfera mágica misteriosa do segundo conto ainda está presente aqui no meu quarto, mas porque a minha antologia de contos do Machado de Assis obedece a ordem cronológica e a ordem alfabética também. Racionalidade deveria ser imparcial, mas… Assim sendo, “Uns Braços” e logo após “A Cartomante”… Machado quer mesmo me dizer algo Inácio, Camilo, Rita. Mesmo D. Severina e Vilela, apesar de ser personagens de ação, “poderosas” mais do que os outros poderíamos dizer; também estão no mesmo barco levado pela correnteza dos acontecimentos indiferentes aos apelos humanos. De que adiantaria Inácio abrir os olhos naquele domingo e/ou Camilo acreditar? E o que eu, Aldrin, posso fazer? O que você, que me lê agora, também pode fazer? Somos levados pelo grande rio...


* Causa Primeira, Causa Eficiente. Alô alô, Aristóteles e a turma do Positivismo Lógico! O que colocou todo esse universo em movimento? Isso lembra-me quando o ateísmo estava na moda e eu participava de todas aquelas discussões sobre a existência de Deus no Orkut e FaceBook. 2009, 2012, por aí. Sou agnóstico, então, teoricamente, eu devia ser o mais calado e humilde durante aquelas discussões; mas a agressividade e arrogância daqueles teístas animavam-me a participar das discussões. Eu não incomodava os ateus porque julgava eles uma minoria inofensiva. Eu podia ser educado e era mesmo durante as discussões, mas acho que eu era tão arrogante quanto todos eles. Mas apesar do caráter predominantemente lúdico para mim daquelas discussões eu prestava bem a atenção. Uma afirmação que era relativamente comum que os teístas faziam era que “o infinito não é real”. Aparentemente infinito é bom para o ateísmo. Bom, eu não sou aluno de filosofia ou teologia; mas posso imaginar que se o infinito existisse seria um problema grande saber onde Deus dorme depois de trabalhar. Dizer que Deus poderia morar “antes do infinito” ou “depois do infinito”, poderia parecer poético demais para aqueles teístas tão preocupados em serem racionais. Obviamente que aqui, como em todos os lugares e ocasiões, e em todos os tempos; são os poetas que detêm toda a verdade:

Tão correto e tão bonito

O infinito é realmente

Um dos deuses mais lindos

[Eduardo Dutra Villa Lobos, Marcelo Augusto Bonfá, Renato Manfredini Júnior e Renato da Silva Rocha; o grupo musical a Legião Urbana. A cantora Zélia Duncan é a intérprete que fez a versão canônica de “Quase Sem Querer”. A escutem mais brevemente possível! É uma gravação feita a partir de um show da Zélia. Começa com “Faaaaalaa...”.]