quarta-feira, 13 de julho de 2022

Antologia do Folclore Brasileiro, Cascudo

 

"Quero que saibam qual o motivo de se defenderem os índios de tal maneira. Hão de saber que eles são súditos tributários das Amazonas, e conhecida a nossa vinda, foram pedir-lhes socorro e vieram dez ou doze. A estas nós a vimos, que andavam combatendo diante de todos os índios como capitães e lutavam tão corajosamente que os índios não ousavam mostrar as espáduas, ao que fugia diante de nós, matavam a pauladas. Eis a razão por que os índios tanto se defendiam.

Estas mulheres são muito alvas e altas, com o cabelo muito comprido, entraçado e enrolado, na cabeça. São muito menbrudas e andam nuas em pêlo, tapadas as suas vergonhas, com os seus arcos e flechas nas mãos, fazendo tanta guerra como dez índios. E em verdade houve uma dessas mulheres que meteu um palmo de flecha por um dos bergantins, e as outras um pouco menos, de modo que os nossos bergantins pareciam porcos-espinhos."

(Frei Gaspar de Carvajal)


"Deve ser ainda mencionada aqui uma farsa, denominada SERRAÇÃO DA VELHA, indicadora de que já passou metade da quaresma. Essa brincadeira é organizada pelos soldados. Para a zombaria é escolhida, entre as moradoras da cidade, uma mulher já idosa, mas ainda coquete. Quando pois, é chegado o tempo, já essas mulheres estão preocupadas e temerosas de serem colhidas pela sorte. Faz-se uma figura recheada de palha, tão parecida quanto possível com a mulher em apreço, com trajes iguais aos que ela costuma usar, de modo a ser reconhecida imediatamente. Numa das mãos põe-se-lhe um rosário e na outra uma serra para indicar que o jejum quaresmal é cortado ao meio. Então a figura é posta numa padiola e, acompanhada pelos soldados com sabres desembainhados e archotes, é conduzida por quatro negros através da cidade, por entre a jubilosa gritaria dos negros e das crianças. Um grotesco mascarado abre o cortejo e, durante as paradas, lê o testamento da velha, composto com grande exagero, em que são vituperadas as suas vaidades da maneira mais inconveniente. Toda a tropilha aplaude furiosamente. Finalmente, chegando cortejo à residência da própria mulher, a figura é serrada em duas e queimada, o que sempre termina em pancadaria, porque os parentes da vítima se sentem igualmente ofendidos e procuram enxotar os indelicados visitantes."

(Johann Emmanuel Pohl)


"Começou a seguir um caminho muito longo. Lá adiante encontrou Acarajé e pediu-lhe que o ajudasse a preparar-se que lhe ensinaria o caminho. Ela o fez de boa vontade e ele indicou-lhe a estrada. Andou, andou e lá adiante encontrou umas pedras grandes com forma de gente que lhe pediram que ela os colocasse melhor. A menina com muito esforço conseguiu fazer e as pedras lhe ensinaram o seu caminho. Adiante encontrou Adjinacu (Cágado?) que também lhe pediu prestasse o serviço de auxiliá-lo no trabalho que estava fazendoe a menina prestou-se de boa vontade. Também Adjinacu mostrou-lhe o caminho. Muito adiante encontrou uma onça parida, a quem pediu que ensinasse o caminho e a onça lhe perguntou se não tinha medo de ser comida, repondeu que a comesse logo para acabar com a sua lida. A onça ensinou-lhe o caminho. Adiante encontrou um menino que batia feijão. Pediu que lhe ensinasse o caminho, e o menino disse que o fazia se ela o ajudasse."

(Raimundo Nina Rodrigues)


"A PIRANHA

Compõe-se de homens, mulheres e até crianças que formam uma grande roda, saindo ao meio dela um dos dançantes que executa passos variados ao tempo, em que os da roda girando à direita e à esquerda, cantam:

Chora, chora, piranha.

Torna a chorar, piranha:

Põe a mão na cabeça, piranha.

Piranha!

Põe a mão na cintura...

Piranha

Dá um sapateadinho.

Mais um requebradozinho...

Piranha

Diz adeus ao povo,

Piranha

Pega na mão de todos,

Piranha

A tal piranha faz o que se lhe manda, chorando, pondo a mão na cabeça, etc. Por fim conseguindo agarrar a mão de um qualquer dos da roda, puxa-o para o meio do círculo, tomando-lhe o lugar. Assim se continua."

(Antônio Americano do Brasil)


ANTOLOGIA DO FOLCLORE BRASILEIRO – Luís da Câmara Cascudo.

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