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terça-feira, 3 de outubro de 2023

Zen-Budismo 2 de 10

 

Zen-Budismo 2 de 10

 

Mal começamos a conhecer o ponto de vista do Zen-Budismo e imediatamente aprendemos aquele tipo de lição que coloca a nossa vida de cabeça para baixo, ao mesmo tempo que nos faz renascer intelectualmente e emocionalmente: o conceito budista da temporariedade.

Tudo está mudando o tempo todo. Isso é óbvio, o que não é óbvio é isso na prática: a sua dor, a sua felicidade, o próprio Buda, a autoridade dos outros, a sua idade, o que você pensava da vida, as verdades científicas... Não é óbvio que o tempo passa e que tudo está mudando.

Não é óbvio que tudo está mudando e que o tempo passa porque frequentemente você se olha no espelho e leva um susto sobre o que fez e está fazendo de sua vida. E você ri e chora quando olha para você mais novo ou você mais velho. Como é possível você levar um susto sobre o que você fez da própria vida? Você por acaso estava dormindo?

É o rio. Nós estamos no rio. É o mesmo rio do Sidarta de Herman Hesse e o mesmo rio do ensaio sobre a velhice escrito pelo meu amado Bertrand Russell. Rio ou caminho estelar do filme “Contato” (“Contact”, 1997, Jodie Foster, Robert Zemeckis, Carl Sagan, James V. Hart, Matthew McConaughey e etc.). Em última análise não deve haver nem morte ou nascimento, só este rio mesmo. Acho que as aparências e a dor e o prazer é que nos distrai. É fácil se distrair. Eu que o diga, com nome de astronauta eu vivo mesmo no mundo da Lua. Ou no quarto anel de Saturno.

E se tudo muda e se estamos no rio, não podemos nos afogar. Se a gente fica distraído ou desesperado nós não boiamos e acabamos nos afogando. Então se tudo muda nós devemos ser mais serenos diante da vida. Difícil porque em 2023 aqui no Ocidente é tanto estímulo na internet, televisão, é tanto medo nas ruas, tanto sexo insatisfatório, e tanto vazio interior e tanto desgosto por trabalho chato e salário insuficiente!

 

 

 

Livremente inspirado em “Segunda Parte Introdução às Teorias Orientais da Personalidade” e capítulo 10 “Zen-Budismo”. Do livro Teorias da Personalidade, de James Fadiman e Robert Frager (Traduções de Camila Pedral Sampaio e Sybil Safdié; com a coordenação de Odette de Godoy Pinheiro, 1979, São Paulo, Editora: Harbra Editora Harper & Row do Brasil Ltda).

domingo, 1 de outubro de 2023

Zen-Budismo 1 de 10

 

Zen-Budismo 1 de 10

 

 

Acho que podemos chamar este fenômeno cultural de “onda de orientalismo”. De repente há uma curiosidade, um desejo, aqui no Ocidente, de conhecer o Oriente. Na esperança de ali encontrar novos valores, ideias e caminhos. Não é raro no Ocidente o sentimento de desorientação e frustração profunda. A cidade nos isola, os meios de comunicação nos deixam tristes, a política agride, a ciência é estrangeira e os sacerdotes não são humanos...  

Não sou especialista, mas acho que tivemos uma “onda de orientalismo” forte na virada do século XIX para o XX, em meados da década de 1940 (por exemplo, meu avô paterno tinha muitos livros do chinês Lin Yutang) e na década de 1960. Desde os anos 2000, para trazer o assunto para mais próximo de nós, os livros de Dalai-Lama são muito populares. Pois bem, Fadiman e Frager mencionam que em meados da década de 1970 (Personality and Personal Growth é de 1976) também havia uma “onda de orientalismo” bem forte. E ela se fez sentir entre estudiosos da Psicologia e Psicanálise e outros estudiosos da mente humana.

 

É importante lembrar que apesar da antiguidade realmente milenar e do caráter profundamente pessoal (quanto aos fundadores) dessas escolas de pensamento religioso-filosófico, a importância delas hoje e sempre se dá pelo seu poder de readaptação aos novos tempos e ao fato que milhões de pessoas em dezenas de países as veem como realidade viva e não abstração acadêmica. Não obstante, muitos cientistas ocidentais demoraram a aproximar-se do fenômeno religioso-transcendental. Por motivos preconceituosos, ao assumirem por princípio que isso não era área científica e sim questão de fé pessoal. Ou mesmo por uma questão mais técnica, dado que a linguagem científica convencional não conseguia dialogar com a linguagem religiosa. Os termos de ambos os lados se chocavam em vez de dançar.

 

Eu já vi isso em Rubem Alves, já vi em Herman Hesse, em Joseph Campbell e, com algumas variações, também vi em Nietzsche. E até podemos ouvir Belchior em Como nosso pais. E, também, claro, claro, também a Raposa amiga do Pequeno Príncipe contou a ele e a nós. Agora estou aprendendo a mesma lição em uma história budista pela voz do próprio Buda: é preciso prestar atenção e não deixar escapar. Mas prestar atenção em quê e não deixar escapar o que? A gente sabe e não sabe. Ou melhor, a gente sabe; mas acaba esquecendo facilmente. Preste atenção na realidade, na verdade oculta, no tesouro essencial... Cuidado para argumentos lógicos e crachás de autoridade não prenderem os seus pés como algas perigosas durante a travessia de um rio mortal. Preste atenção no que importa.

 

 

Livremente inspirado em “Segunda Parte Introdução às Teorias Orientais da Personalidade” e capítulo 10 “Zen-Budismo”. Do livro Teorias da Personalidade, de James Fadiman e Robert Frager (Traduções de Camila Pedral Sampaio e Sybil Safdié; com a coordenação de Odette de Godoy Pinheiro, 1979, São Paulo, Editora: Harbra Editora Harper & Row do Brasil Ltda).

quinta-feira, 5 de janeiro de 2023

Para o Mundo

 

Para o Mundo


Já escrevi aqui sobre a lista de autores e livros que por causa do Brasil e do Eduardo Bueno ([História do Brasil (1997, Folha da Manhã e Zero Hora/RBS Jornal. Segunda edição.)], eu quero preciso comprar. Mas isso é por causa do Brasil. Agora vamos para uma lista de sonhos por causa do mundo.



Paidea – A Formação do Homem Grego; de Werner Jaeger. Naturalmente que a beleza vai mais longe que a ciência e a religião, então seria melhor Homero, Ovídio e Eurípedes e outros da família; mas aqui é na não-ficção. No mais vai ter mesmo algumas obras literárias que eu só teria acesso mesmo indiretamente em livros de não-ficção.



Filosofias da ÍndiaHeinrich Zimmer (Obra póstuma, organizada por meio de seleção de textos por ninguém menos que o Joseph Campbell). A cultura indiana, acho que posso dizer, é quase tão divulgada quanto a cultura grega. Acho que posso dizer que vou mais do que simplesmente molhar os pés neste oceano infinito.



Poesia Chinesa Antiga. Tem várias antologias publicadas no Brasil. Não saberia indicar a melhor. Uma edição que seja profissional terá introdução com os dados filosóficos e sociológicos necessários. Se for comprar um livro in loco você folheia o livro e vê se a introdução parece razoável ou se o cara está apenas tentando parecer inteligente. É preciso ter um pouco de malícia para diferenciar. Uma coisa objetiva é se na introdução tiver uma parte sobre a tradução. Seria uma dica objetiva, mas temos o problema de ser um livro traduzido do oriente. Então é claro que teria um trecho sobre as dificuldades da tradução. Ah, sei lá. Você folheia a introdução rapidamente e se no texto a pessoa lamenta, se coloca de forma humilde eu acho que seria suficiente. Tradutor que não sabe o que é angústia, com certeza, não é confiável.



Alguma coisa sobre judeus, muçulmanos e árabes? Eu tenho e comecei a ler, mas depois parei, O Livro das Mil e Uma Noites. Holocausto – A Saga da Família Weiss (“Holocaust”, 1978, Joseph Bottoms, Tovah Feldshuh, Rosemary Harris, James Wood e etc.), que eu assisti quando criança pela Rede Manchete de Televisão. Sei que assisti a todos os episódios na companhia de meu pai e que por causa da série fiz um desenho dramático. O desenho se perdeu, assim como lembranças mais específicas. Eu também li o livro A Trégua, de Primo Levi. Foi há mais ou menos uma década e a lembrança é mais viva, temperada pelo contraste ambiente do livro ambiente de onde fiz a leitura: li o livro no verão, na praia. Gostei muito e pretendo ler mais o Primo Levi. A propósito: assistam assistam assistam assistam ao filme “Primo” (Primo, 2007, Anthony Sher, Richard Wilson e etc.)! Filme maravilhoso na mensagem e na técnica narrativa. Há ainda Humor Judaico – Do Éden ao Divã (seleção, organização e edição por Patricia Finzi, Moacyr Scliar e Eliahu Toker. Editora Shalom, Buenos Aires e São Paulo, 1990.) A edição mais recente deste último livro é de 2017.



Sobre a África eu já tenho em PDF a História Geral da África (Vários Autores, Unesco, 1981). Cadê o link do Domínio Público? Internet lenta e mudança de endereço. Agonia!

Ora, ora… Surpresa boa! Mas vamos começar pelo começo.

A coleção de 8 volumes pode ser downloadada aqui https://ipeafro.org.br/gratuito-historia-geral-da-africa-em-8-volumes-7357-paginas-em-pdf/ ou aqui https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000190257 . Mas vejam só, a história vai ser aumentada! História é vida e humanidade. Estamos em movimento, portanto. https://www.gov.br/mec/pt-br/etnico-racial/noticias-1/historia-geral-da-africa-2013-nono-volume Destaco um trecho da entrevista que Rosilene S. da Costa (Ministério da Educação) realizou com Ilma Fátima de Jesus, Coordenadora-Geral de Educação para as Relações Étnico-Raciais. É a última pergunta.

Foi a primeira vez que você esteve na África. Qual o sentimento de pisar em solo africano e de participar de alguma forma da elaboração deste tão importante livro?


O sentimento de pisar em solo africano pela primeira vez para quem tem consciência das raízes africanas presentes na vida é de uma emoção imensa, principalmente quando se tem uma trajetória no movimento negro que reivindicou a inserção da História da África e dos negros no Brasil no currículo escolar brasileiro. Eu esperava ansiosamente pelo momento em que teria condições de realizar uma viagem para o continente africano, porém não tinha noção de quando seria e, enfim, esse momento se concretizou para minha felicidade. Sou muito grata pela oportunidade que me foi dada e me sinto imensamente feliz por ter ido à Etiópia, país africano que pesquisei no final dos anos 90 quando cursava o Mestrado em Educação na UFMA. Eu pesquisei a comunidade remanescente de quilombo de São Cristóvão, no município de Viana, Maranhão, estado onde nasci, e que o líder quilombola, Senhor Diomar, informou que os "brancos" da sede do munícipio de Viana se reportavam aos quilombolas daquela comunidade como o povo da Abissínia, hoje Etiópia. Isso fez com que aprofundasse o meu conhecimento sobre aquele país. A emoção também foi grande ao visitar o palácio do imperador da Etiópia, Haile Selassie, conhecido como o que encerra o ciclo de impérios na Etiópia e que participa da criação da Organização da Unidade Africana e tem reconhecida influência sobre o movimento negro, em especial em lideranças do movimento negro como Martin Luther King e Nelson Mandela.

(A entrevista realizada pela Rosilene, feita em 2013, pode ser lida na íntegra aqui: https://www.gov.br/mec/pt-br/etnico-racial/noticias-1/historia-geral-da-africa-2013-nono-volume .).



O trem realmente fica complicado na parte da Oceania. E eu amei amei amei amei tanto tanto Moana – Um Mar de Aventuras (Moana, 2016, Ron Clements, John Musker, Don Hall, Chris Williams, Pamela Ribon, Aaron Kandell,Jordan Kandell e etc.)! Ou a situação não é assim tão complicada?

Coleção Infantil Descubra o Mundo Volume OceaniaMarta Ribon. Primeira edição, 2009. Primeira e única edição.

Brasil e Oceania – Gonsalves Dias. Héin? Pausa. É que o poeta era funcionário do Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro e ele tinha que atender um pedido do imperador Dom Pedro II. Daí a monografia, organizada postumamente pelo amigo do poeta Antônio Henriques Leal. Primeira e única edição, 2013. O livro tem 400 página, acho que deve ser encarado como algo mais do que curiosidade de um poeta talentoso que precisava pagar suas contas.

Raga: Uma viagem à oceania, o continente invisívelJ.G.M. de Le Clezio. O ganhador do Nobel de Literatura conta, de forma romanceada, a chegada dos europeus à Oceania. Primeira edição, 2011.

Historia Postal da OceaniaAdeilson Nogueira. Não há tento introdutório na Amazon a respeito do livro. Parece que o livro é parte de uma coleção que apresenta lugares do mundo através de cartões-postais. O que é uma ideia ótima sim. Não tenho certeza se existe edição impressa, ou se só há edição eletrônica do livro.

Notinha técnica: todos esses livros que selecionei sobre a Oceania estão em suas primeiras edições. Tem livro de 2009 e 2011! Ninguém se interessa pela Oceania aqui no Brasil? Tadinha da Oceania! Tudo bem que só olhei pelo site da Amazon, mas mesmo assim… É um detalhe técnico interessante.



E a América e a Europa? Pois é, acho que mesmo a América Central e os países europeus eu conheço bastante. Ah, vocês me entenderam. Agora comprem esses livros para mim! É, você, compre esses livros todos para mim!

quinta-feira, 14 de julho de 2022

Livros do Joseph Campbell

 

Livros do Joseph Campbell


Agora a memória afetiva. A leitura de O Herói de Mil Faces e O Poder do Mito foi marcada pela ocasião e contexto: um dos melhores empregos que eu tive na vida. Eu era porteiro e vigia temporário na Câmara de Vereadores de Rio Acima.


Era perfeito. Manhã e tarde. A parte mais difícil era hastear as bandeiras do Brasil, Minas Gerais e Rio Acima; uma vez que minha coordenação motora era tão ruim que por pouco quem subia amarrado era eu. A solução era um nó simples demais e fé na força como quando a gente amarra o tênis.

Era perfeito. Eu ficava sempre na guarita, fugindo do sol impiedoso enquanto afogava-me com a quantidade de café que a mulher da cozinha me dava. Era o dia inteiro tomando café, na sombra e lendo Jospeph Campbell. E o almoço gelado preparado pela mãe e guardado uma vasilha plástica numa sacola térmica. O trabalho era temporário e eu era zeloso, mantendo as portas fechadas e sempre perguntando o que as pessoas que queriam entrar queriam fazer ali. Acho que eu deixei uma boa impressão. Sei lá. Lembro também de conversar com um ajudante geral chamado Ivan. Achava incrível que todo mundo que passava perto de nós o conhecia e o cumprimentava. Lembro-me dele contando sobre como um trabalhador deve manter a dignidade e histórias também de quando ele jogava bolas de gude quando criança.


O contraste entre o mundo de Campbell e a minha situação ali foi fundamental. Eu não interpretaria/compreenderia como compreendi/interpretei O Herói de Mil Faces e O Poder do Mito se não fosse aquela situação. Certo? Bom, não tenho como saber.


Os livros de Joseph Campbell são razoavelmente fáceis de serem encontrados. E os preços são ótimos. O Herói de Mil Faces tem seu charme pelo seu tamanho pequeno, letras que sugerem um dicionário ou livro técnico sem graça e a cor azul-verde-piscina. E o desenho de capa… Já O Poder do Mito é puro luxo, você tem que folhear e saborear as ilustrações antes de ler. E deslisar os dedos pelo papel sofisticado. Muito muito bonito. E o trem é grande. Preciso comprar Filosofias da Índia, é do Heinrich Zimmer mas quem organizou as anotações foi o Campbell.

quinta-feira, 30 de junho de 2022

Aniversário

 "Dreamer" - SuperTramp.

"Tomorrow People" - Ziggy Marley & The Melody Makers.

"Karma Chameleon" - Clube Cultural.

"Once Upon A Long Ago" (Versão longa, a de seis minutos) - Paul McCartney.


Assim assim passo por mais uma noite. Afinal, hoje é meu aniversário e para gente como eu esse tipo de data é perigosa. Engraçado como eu sobrevivo fácil. Não preciso de muito. Ou preciso de muito. O que pode ser maior do que uma música boa?


Caroline Polachek catando em um show também ajuda. Algumas músicas são tão sofisticadas e os v´´ideoclipes também que a gente teme que não funcione bem ao vivo, mas: só ela, um microfone, um guitarrista e um baterista e... oh! Uma artista.

Ah, quase me esqueci. Se fosse Platão, o Mestre diria que isso é a alma lembrando/reencontrando a verdade: como algumas músicas podem ser recentes se elas parecem ser mais antigas para mim? "Hava Nagila" foi composta em 1918? Ela não tem três mil anos? Outro caso e de "It's just a burning memory", do The Caretaker. Comp pode ser de 2016 e não de 1916? Aliás, esta música tem algo de Manoel de Barros: Tem mais presença em mim o que me falta

segunda-feira, 11 de outubro de 2021

Água para Tsai e Shimon

ÁGUA PARA TSAI E SHIMON


HISTÓRIA DAS CAVERNAS AO TERCEIRO MILÊNIOMyriam Becho Mota e Patrícia Ramos Braick, 1998.

(1a. Edição, 1998, Editora Moderna Ltda, São Paulo, SP.)


A sorte do Carlos Fernandes e do Frank Lynch estava dentro de uma caverna a 1500 metros de altitude, na ilha de Mindanao (Filipinas). Era 1971 e eles encontraram um grupo humano que vivia como nossos mais antigos antepassados. Os tsai.

Grupo pequeno, recolhem alimentos, tem poucos instrumentos, alguns casais (hétero afetivos) e nem sinal aparente de práticas religiosas. Simples simples mesmo, pois para o trabalho de recolher alimentos uma manhã basta; tendo o resto do dia para descansar e conversar. Nem formas de liderança foram encontradas, sendo as decisões na base da conversa e consenso simples: como um grupo de moleques decidindo se foi pênalti ou não em uma partida de futebol na rua. Bem simples.

Bom, isso é maravilhoso. Longa vida aos tsai! Que a gente os ajude da forma que for melhor para eles! Se eu algum dia vou visitar as Filipinas? Nem penso nisso. Agora é interessante observar que se eles desconhecem agricultura e caça, ficam muito muito vulneráveis aos “humores” da floresta. Assim; e se chover demais ou de menos? Se uma planta ou animal estranho ao local aparecer e mudar a ecologia do trem lá? Imagino que isso já tenha acontecido e a solução dos tsai tenha sido mudar de lugar. Um paraíso, mas um paraíso meio delicado... Outra coisa é que o grupo é pequeno e isso é fundamental na estrutura social deles. Um paraíso, mas um paraíso meio delicado... Mas é maravilhoso! E numa caverna a 1500 metros de altitude!

No Brasil temos os índios txucarramãe, mas por mais que na legenda da foto fale em atitudes paleolíticas; não é possível ignorar que a mulher na fotografia usa um vestido beeeem não-indígena. A fotografia foi realizada pelo Arthur F. Costa.

Procurar informações sobre a Fundação Paramin.

Procurar o livro “900 Textos e Documentos de História”, de Gustavo Freitas (Editora Plátano, Lisboa, 1977.) Senhoras e senhores, olhem o nome deste livro! Minha formação humanista está com água na boca. Eu preciso deste livro Eu preciso deste livro!


O chamado “elo perdido” seria um espécime que dividiria características primatas e humanas. Achar o danado ainda é difícil, mas, pelo menos, sabemos que ele teria vivido aproximadamente há 800 mil anos. Parece uma pista fraquinha, mas para as cientistas e cientistas é muito.


Preconceito é ruim, então cuidado ao falar das primeiras sociedades humanas. “Ah, mas eles não tem escrita, não tem Estado, sem tecnologia, sem isso e sem aquilo e blábláblá...” E você é um sem noção! Não é nivelar ou achar que o passado é melhor; é ter respeito e humildade na hora de entender e se colocar no lugar deles!


Silex, obsidiana (vidro de vulcões), basalto, quartzo e quartzito. Materiais que ajudaram a nós humanos a “fazermos” este mundo.

Disso aí eu só conheço, - e conheço mal –, o quartzo. O meu amado Câmara Cascudo em uma citação recolhida pelo Diógenes da Cunha Lima fala bem poeticamente do basalto como um material muito resistente. Vou procurar imagens pela internet, pois se eu tropeçar em um basalto nem vou saber como é a aparência do trem. Ah, sim, a citação que falei é essa:

- Exijo que você escreva o prefácio desta segunda edição. Livro é como basalto: fica para a posteridade. Eu quero que no mesmo livro estejam reunidos Dante Alighiere, Câmara Cascudo e Franco Jasiello.

Só consegui pegar na mão do mestre e beijá-la. Ao meu gesto, a resposta:

Deus te abençoe, meu filho. Vá baixar em outro terreiro.

(Câmara Cascudo Um brasileiro Feliz, de Diógenes da Cunha Lima. Quarta edição. Escrituras Editora, 2016, São Paulo. Página 187.)


O homem de Neanderthal foi um caçador sofisticado sim.


Revolução neolítica ou revolução agrícola. E dentro desta a “grande pedra”, uma cultura que valorizava grandes esculturas (cultura megalítica). Aqueles monumentos que nos encantam até hoje e nos fazem pensar como nossos antepassados conseguiram realizá-las. Alguns, de tão encantados, pensam até em alienígenas e deuses (e deuses que eram astronautas). Estes monumentos podem ser encontrados na Europa ocidental, no Mediterrâneo e ao norte da África. É, isso mesmo leitoras e leitores, entre os exemplos megalíticos temos as famosas pedras de Stonehenge. O escritor Eduardo Bueno, comentando a crise de luz elétrica que atingiu o Estado do Amapá (2021) em um vídeo do YouTube; menciona que no Amapá também tem um monumento de rochas grandes semelhantes ao Stonehenge. Perto da Linha do Equador, a escultura megalítica do Amapá provavelmente era uma espécie de relógio solar.


Outro livro que me atraiu: “Imperialismo ecológico”, de Alfred W. Crosby.

No Velho Mundo havia maiores agrupamentos humanos e havia isso há mais tempo do que no Novo Mundo, de modo que no Velho Mundo a transição do estilo de vida mais nômade e caçadora para um estilo de vida mais sedentária e agrícola aconteceu mais rápido. Bom bom para lembrar a diferença que faz o ambiente: em tal cidade tem muita gente? Em tal cidade tem menos gente? Imagino o que acontece quando numa cidade pequena aparece uma mineradora. Trabalhadores do país inteiro aparecendo ali em menos de seis meses! Imagine a transformação! Isso também sugere uma “lei” da histórica: a tendência é o grupo humano crescer muito aí ou fica sedentário ou fica nômade, mas os nômades não tem sucesso ou ficam sempre em menor número… Mas esse trem de falar em “lei” da história não me parece agradável: preciso comprar e ler “A Miséria do Historicismo” do Karl Popper!


E na Austrália o Paul Tacon descobre que nós fazemos guerra uns contra os outros há, pelo menos, o dobro do tempo que imaginávamos.

Antes da chamada “idade dos metais”, aproximadamente 3 mil anos antes de Cristo.


Agora já temos caça, agricultura, animais domesticados, guerras organizadas com vencidos tornando-se escravos, metal dominado, práticas religiosas, centros populacionais que podem se chamar “cidades” sem falsa humildade… Pronto, estamos prontos para as primeiras grandes civilizações!


Antes, uma notinha sobre a ocupação humana na América. Belo exemplo de como a ciência é atraente: a cada pergunta, ergue-se diante de nós mil horizontes de hipóteses; a cada resposta, mil novas perguntas e o ciclo recomeça.

Sabemos pouquíssimo a respeito da ocupação humana no continente americano.

Foi atravessando a Sibéria e o Alasca? Mas e os sítios arqueológicos mais ao sul da América e que são mais antigos que os 11500 anos da referida travessia? A Marta Mirazón Lahr lembrou do sítio de Monte Verde, no Chile. Eu lembro de Niéde Guidon e da sua grande obra, o Parque Nacional da Serra da Capivara (Piauí). Para complicar mais; a pesquisa genética parece indicar que os primeiros americanos não são próximos dos antigos chineses, japoneses e coreanos (o nordeste asiático, de onde partiram quem atravessou o estreito de Bering mais ou menos no período citado de 11500 anos atrás). E antes de terminar, para o Peter Lund aqueeeele abraço!


Não foi o fato que por pouco um estacionamento para ônibus cheio de turistas iria ser construído bem em cima destruindo-o, e sim o surpreendente é o fato de que a descoberta aconteceu justamente num sítio arqueológico que todo mundo pensava que já estava esgotado. “Ônibus cheio de turistas”, um sítio arqueológico saturado de tão investigado… Estamos falando de décadas e décadas estudando o Antigo Egito e o seu encantamento irresistível. Temos até um nome para isso: egiptologia!

Bom bom, no caso eu me referia à descoberta de uma tumba mais complexa do que as tumbas normalmente encontradas. O crédito vai para Kent Weeks e sua equipe da Universidade Americana do Cairo. A propósito, imagine a quantidade de artigos e ensaios publicados sobre o Antigo Egito em jornais e revistas científicas no mundo todo todo mês! Como uma pessoa leiga poderia acompanhar as últimas descobertas sobre egiptologia?


O rio Nilo + o rio Tigre + o rio Eufrates = Ocidente.

O local, o nome de uma verdadeira lenda: o “crescente fértil”!

Temos as primeiras grandes civilizações: Egito antigo e a Mesopotâmia. Somos ocidentais filhos do oriente que estava terminando o neolítico.


O rio Nilo nos deu um presente e este presente é o Antigo Egito.


Havia dois antigos “egitos”: o reino do norte e o reino do sul. Mais tarde os dois se unem sob a liderança daqueles que eram chamados de “faraós”. Daí, cerca de três mil anos antes de Cristo até trinta antes de Cristo quando os romanos a conquistam, temos a “aventura egípcia” propriamente dita. Agricultura, irrigação, pirâmides, conhecimentos astronômicos e meteorológicos uma vez que o comportamento do rio era importante para a alimentação, conhecimento de anatomia e cirurgias sofisticadas no crânio e no estômago como consequências das práticas de mumificação… É, a egiptologia é mesmo irresistível. Vamos parar por aqui, pois senão eu não termino.

Mas vale uma notinha filosófica: viver é bom, mas para o Antigo Egito a morte não era um fim triste. Outra notinha, desta vez política: durante grande parte de sua história, a parte mais feliz, eles eram pacifistas e isolados. No final do período os antigos egípcios são invadidos e começam a guerrear e a invadir outros povos. Crescem de território, mas a decadência já tinha começado. E uma nota assustadora: a decadência do Antigo Egitodurou séculos. Séculos! Você imagina que uma coisa dessas seja rápida. O medo aqui é quando olhamos para o nosso “umbigo temporal” de 2021: e se nós estivemos em plena decadência de nosso mundo? Qual a profunda e radical mudança que ainda estaria invisível diante de nós prestes a torna-se visível? Isso é meio assuntador e excitante!


Castas sociais, religiosidade onipresente, centralização do poder do faraó, tributos e funcionários de um aparato burocrático que fiscalizava coisas como exploração de terras e a distribuição do excedente agrícola.

Havia muito respeito entre as pessoas, como nas tribos pequenas africanas mais antigas e pequenas que viviam mais ao sul da África; mas o senso igualitário realmente não era mais o mesmo. Por exemplo: é registrado que as mulheres até poderiam trabalhar e ganhar por isso e recorrer aos tribunais em caso de serem vítimas; mas nos estudos o caminho não era assim tão livre a elas no Antigo Egito.


A palavra escrita.

Aparentemente os primeiros livros foram feitos no Antigo Egito. O mais famoso é chamado de “O Livro dos Mortos”; uma compilação de regras para as almas terem um caminho feliz depois da morte.


Nem todo mundo tinha uma pirâmide imensa a servir de túmulo, mas todo mundo tinha o direito ao embalsamento. Havia formas mais baratas de embalsamentos.


Um antigo ditado judaico diz que todos os milagres concedidos por Deus ao povo de Israel estavam relacionados com a água.


A história não parou durante a aventura egípcia. Na mesma época de seu nascimento, lá em cima, na parte mais asiática da “Lua” da região do Crescente Fértil nasceram outros povos. Foi entre rios, foi a Mesopotâmia. Eram os sumérios, acádios, assírios e babilônios.

Pausa.

Como eram os acádios?

Fim da pausa.


O Antigo Egito, lembremos, na sua fase mais feliz era pacifista e isolado. Méritos deles; mas também havia ali um deserto do Saara para protegê-los, né? Bom, na Mesopotâmia havia nada disso. Ao contrário, o local parecia mais uma avenida livre para povos invadirem. A história ali foi tumultuada.

Bom bom, mas os sumérios tiveram tempo e talento para conquistas fundamentais para o gênero humano nos campos da escrita, arquitetura, comércio.


Quem fundou a famosa Babilônia foi um povo invasor que veio do meio do deserto da Arábia, o povo amorita. “Amorita”, “amorita”, já li esse nome em algum lugar… É o momento de nomes familiares: Hamurábi e seu código de leis, a Lei de Talião, Nabucodonosor… Pausa para escutar Verdi!

Império Assírio foi outro nascimento importante. A violência deste povo os diferenciava dos outros povos que ficavam mais ao sul do Crescente Fértil. O Império Assírio também se destaca pelo seu expansionismo; em seu auge a área dominada foi imensa.

Mas nada dura para sempre e um povo semita, os Caldeus, derrotam os assírios. Foi quando apareceu o já citado Nabucodonosor.

Os famosos jardins suspensos ficam no atual Iraque. As construções babilônicas eram bastante coloridas, mas infelizmente isso se perdeu com o tempo. É triste também que o atual Oriente Médio seja um local tão violento, pois isso dificulta a visita de turistas. Seria bom que ruínas tão gloriosas fossem vistas por mais gente.


Sobre o dia a dia, vale destacar que a matemática teve grande desenvolvimento pelos povos da Mesopotâmia. Outro destaque é que as fronteiras entre religião, magia e ciência eram tênues; de modo que um templo religioso também era hospital, biblioteca e também onde astrônomos trabalhavam e seleiro para guardar comida! Uau! A sociedade era dividida em castas.


Agora é outro reino e neste reino tivemos a cidade de um dos poemas mais famosos do Manuel Bandeira (Pasárgada) e do livro da Marjane Satrapi e do filme de Vincent Paronnaud e Marjane Satrapi (Persépolis).

O Reino da Pérsia surge da união dos dois grandes povos que viviam no Planalto do Irã, os medos ao norte e os persas mais ao sul.

Pausa.

Os povos medos!

Cara, estudar história é muito muuuuito doido!

Fim da pausa.

Ciropédia” ou “Educação do Ciro”, um livro que eu tenho e que ainda não li. Depois do Ciro, veio o Cambises e depois deste o Dario I e aí é que o trem fica sério mesmo. Cambises morreu sem deixar herdeiros, de modo que Dario I foi escolha da cúpula política. Escolha inteligente. Nem todo império sobrevive a um momento delicado como uma sucessão. Sorte dos persas pela escolha. Mas vamos continuar.

Continuar pela “estrada real” do Dario I! Quase três mil quilômetros de uma estrada vigiada por patrulhas, algo tão importante quanto o surgimento da primeira moeda aceita internacionalmente. Dario I teve um descendente e aqui temos outro nome famoso: Xerxes. Mais expansão e controle de um imenso império, mas as guerras contra as cidades-estados do mundo grego marcam o início do fim do Império Persa. Mas é preciso destacar que só acaba nas mãos de ninguém menos que o invencível Alexandre da Macedônia.


Culturalmente falando o Império Persa encantou o mundo por ser bastante eclético devido à influência de diversos povos que eles conquistaram. Mas principalmente a área religiosa a mais popular para nós.

No início era o antigo totemismo: adoravam animais, o sol, o vento… E sacrifícios lhe eram oferecidos. Diversidade que é centralizada e organizada, muito tempo depois, pelo aparecimento de Zaratustra e o livro sagrado “Zend Avesta”. Agora é a luta entre o bem e o mal (Ahura-Mazda ou Ormuz; e Arimã). Juízo Final, o triunfo final do Bem, a vinda do Messias, a liberdade do humano ajudando ou atrapalhando o triunfo final do Bem, o paraíso, a volta dos mortos; o mazdeísmo influenciou as três grandes religiões monoteístas da região: judaísmo, cristianismo e islamismo. Curiosamente acho que a leitora e o leitor nunca deve ter lido e ouvido a respeito do mazdeísmo.


Falamos no passado de judaísmo e água e vamos terminar comentando um trecho de “O Novo Oriente Médio”, livro de Shimon Peres (Editora Relume Dumará, 1993, Rio de Janeiro).

Mau planejamento e exploração predatória do meio ambiente são dois dos motivos para o Oriente Médio sofrer com a falta de água. Não é questão do Thomas Malthus ser o espectro que ronda a questão ali, mas os rios não estão crescendo como a população está crescendo. Tem cientistas bancando profetas e eles não são profetas agradáveis. Um caso especialmente trágico é o Egito e a Síria, mas a comunidade internacional também deveria ajudar a Etiópia e o Sudão quanto a esta questão da água. Mas a questão envolve todo o mundo. Em 1987 a Turquia sonhou com um aqueduto da paz ligando os países da região o excedente de água; mas alguns países árabes não queriam a participação de Israel e este foi o fim do projeto turco. Na questão da água quanto em outras questões, o Oriente Médio seria mais feliz se o Amor vencesse o ódio.

quinta-feira, 30 de setembro de 2021

A Mulher da foto e o livro esperaram por mim

A MULHER DA FOTO E O LIVRO ESPERARAM POR MIM

HISTÓRIA DAS CAVERNAS AO TERCEIRO MILÊNIOMyriam Becho Mota e Patrícia Ramos Braick, 1998.
(1a. Edição, 1998, Editora Moderna Ltda, São Paulo, SP.)
Agradecimentos
Aos nossos colegas professores e colaboradores Ademir Umbelino, Antônio Aluízio, Carlos de Cássia, Edna Campos, Flávia Mary, Marly Áurea, Patrícia Carvalho e Rui Ribas.
Ao Geraldo Fernandes, nosso amigo, pelas horas dedicadas às leituras críticas, sugestões e principalmente por ter acreditado no nosso projeto.
Dedicatórias
Ao meu marido Beto, aos meus filhos Fernanda e Bruno e à minha mãe Maria Alice, pelo apoio e paciência que tiveram durante a elaboração deste trabalho. (Myriam)
Ao meu marido Chico, grande incentivador, hoje leitor ausente, aos meus filhos Matheus e Fabrício e aos meus pais José Ramos e Therezinha, pelo apoio e pela confiança. (Patrícia)


Este livro é do meu tempo de colégio. Colégio, colégio. Tristeza, tristeza, desperdício, desperdício. A dor é de tal ordem que as palavras não dão conta. Mas eu gosto de justiça cultural: eu sempre gostei deste livro e nunca o li por inteiro. Bom, agora eu vou. Bom, agora nós vamos lê-lo. Resumo, interpretação e principalmente convite para conhecer o livro.

Destaque para a parte física da coisa, a parte tátil: o mesmo plástico grosso e transparente o protegendo por mais de 20 anos. Plástico furado, amarelado, a capa tão familiar de tão tão tãããão olhada… Tato, memória, coração.

O que é nosso? Apenas nós e o mundo. Então gostamos de caminhos, pontes, paralelos entre escolas de pensamento, países, pessoas e milênios. Então, qual é a distância entre as reformas religiosas na Europa em 1521 e a influência das seitas pentecostais no Brasil de 2021? Os marqueteiros nos “vendendo” políticos durante as eleições e os teóricos absolutistas como Jean Bodin?

Estudar história deve nos ajudar compreender ativamente a realidade, o que permite a cidadania saudável.

Antes da escrita já havia humanos, já havia agentes históricos. Uma fotografia de uma tribo africana onde não há domínio da escrita. Eles são agentes históricos, preparando a comida para toda a tribo assim como eu agora escrevendo pelo computador. Aliás, qual é o domínio que eu tenho da língua escrita e falada? Já foi dito que a língua portuguesa “é igual a cavalo bravo”, difícil de ser dominada. Eu sei disso… Mas eu também sou agente histórico. Mas participar do Brasil e do mundo, desenvolver o potencial de minha vida por mim mesmo; tão distante quanto a mulher africana na foto que olha para mim?

segunda-feira, 6 de setembro de 2021

As Fábulas, séc. 6 aC

VOCÊ VAI MUDAR

Fábulas”, Esopo; século 6 a.C..
[Tradução de Antônio Carlos Vianna.]

(Editora L&PM Pocket, 1997, Porto Alegre, Rio Grande do Sul; a edição minha é a impressa em 2002.)

Fábulas Completas”, Esopo; século 6 a.C..
[Tradução de Maria Celeste C. Dezotti.]
Maria escreveu uma emocionante pequena dedicatória que esta discretamente no final da edição e que acho bonito reproduzir aqui com destaque devido: 
A tradutora agradece aos professores Fernando Brandão dos Santos (Unesp – Araraquara) e Maria de Fátima Souza e Silva (Universidade de Coimbra), por terem lhe apresentado a edição crítica de Émile Chambry.

(Editora Cosac Naif, São Paulo, 2013. Apresentação de Adriana Duarte e ilustrações de Eduardo Berliner. A minha edição é a da segunda reimpressão, de 2015.)


Comprei primeiro a edição da editora L&PM há muitos e muitos anos, mas nunca a tinha lido completamente. Muitos e muitos anos depois, sabendo do desaparecimento da editora Cosac Naif e sabendo que era uma edição mais completa de uma obra importante para a compreensão do universo humano, comprei a versão deles também. E agora finalmente em 2021 li os dois livros. Apesar de toda a sofisticação da Maria para Cosac Naif, eu gostei muito da versão simples do Antônio para a LP&M de modo que; como ela é muito mais fácil de ser encontrada e comprada, quem me lê não vai ficar tão no prejuízo assim se ler ela apenas.

Antes de mais nada, o grande resumo da sabedoria das fábulas de Esopo: a vida é mudança. Numa hora rico, noutra pobre; numa hora pobre, noutra rico; numa hora saudável, noutra doente; numa hora você tem, noutra hora você não tem; numa hora você não tem, noutra hora você tem; numa hora você pensa que é de um jeito, noutra hora você percebe que é algo completamente diferente do que você pensava. A vida é mudança. Me parece que este é também o coração, com algumas diferenças, da sabedoria de "Os Livros Poéticos e Sapienciais" da minha Bíblia de Jerusalém. Mas ainda não planejei quando vou ler esta parte ou mesmo toda a Bíblia.

Minha leitura de “As Fábulas” de Esopo foi atenta e anotei algumas coisas; mas não tanto para fazer comentários muuuuito sofisticados. Afinal, basta entender a mensagem para mim e não decepcionar o Esopo; e não dirigir-me ao auditório da UFMG ou de Yale.

Antes de mais nada: cadê as mulheres? A participação delas como personagens é próxima do zero. 3 ou quatro vezes, se tanto. Na versão de Antônio Carlos Vianna é surpreendente a ausência do gato, mas na versão da Maria Celeste C. Dezotti esta encarnação da sabedoria e da malícia aparece. E já que falamos de quem tem sabedoria e malícia: e os macacos? Pois é, aparecem pouco muito pouco. Outro detalhe surpreendente. Das divindades gregas, quem mais aparece não é o todo-poderoso Zeus ou a bela-amorosa-popular Afrodite; o deus mais presente é Hermes. O deus protetor dos viajantes, dos comerciantes e também aquele que inventou a música. Hermes inventor da música? Acabamos de descobrir uma dívida que o sincretismo religioso brasileiro tem…

Não sou católico praticante, mas cresci na ética cristã e deste ponto de vista o mundo grego clássico visto pela sabedoria das fábulas de Esopo me pareceu cruel e frio. Mais frio que cruel, dado que também ali um coração bom e sincero vence no final. Mas é frio. Tem alguma coisa fria naquele mundo, mesmo com os elogios à amizade e à lealdade que há ali. E também humildade, a humildade é muito defendida também. Mas vamos às lições mais específicas. Acho que quem me lê pode gostar e aprender. Sei que você é inteligente e se eu for tonto ou muito tonto nos meus comentários, você vai perceber rapidamente sem risco.


A ursa cochichou para aquele viajante uma coisa que sabemos bem: é nas dificuldades que conhecemos os verdadeiros amigos. Pode descer da árvore falso amigo!

Combinou o cenário: o mar. Tantos fatos, tantas ondas, mas você não pode manter diante deles a mesma felicidade. Tudo muda. Veio o tempo bom, como veio a tempestade. O velho marinheiro acertou quando disse que alguma tristeza teríamos mesmo que sentir depois daquela boa pescaria. Destaque para o “teríamos mesmo que sentir”. Ah, velho marinheiro… 

A verdade vence nossos inimigos.

Não ofenda um fraco, pois o dia deste chega. O escaravelho pediu “por favor, poupa meu suplicante!”; mas a águia não teve clemência e devorou quem o escaravelho tentava proteger. Depois a águia se arrependeu. Duvida? Encontre uma águia e pergunte de quem ela lembra na hora de escolher o local para construir o seu ninho. Pois é… 

Como dito antes, a participação das mulheres nas fábulas de Esopo chama a atenção pela exiguidade; mas elas aparecem. E em uma das vezes, em uma das fábulas justamente mais poderosas e inesquecíveis. A história da mulher e do marido bêbado é realmente inesquecível. Inesquecível! Vença o vício o mais cedo possível. Do ponto de vista literário, nem parece uma fábula e sim um pequeno e poderoso conto.

Medroso, medroso, os corvos não estão aqui crocitando por você. Seja mais humilde, medroso! Acha mesmo que o mundo vai parar para ver o seu fim na guerra? Seja mais humilde, homem medroso! Pegue a arma sua que você jogou ao chão e volte para a guerra!

Aposto que quem me lê não sabia disso. A gaivota é uma ave marítima porque espera que o mar devolva-lhe a louça chique que ela perdeu. O morcego só sai a noite para comer porque ele fez tantas e tantas dívidas que se ele sair de dia, com certeza vai encontrar algum credor. E a sarça agarra na roupa da gente porque ela ainda espera encontrar os tecidos que ela encomendou. Aposto que você não sabia disso. Pois agora sabe.

O invejoso perde o que a natureza lhe deu.


Paixão é bom, Amor é bom; perder a cabeça assim é maravilhoso e divino. Ninguém nega, mas… Existem algumas coisas que você não deve abrir mão quando esse rio passar por você (Paulinho da Viola). Coisas da sua essência, captou? A dignidade, o autorrespeito e, se você for um leão apaixonado pela filha de um fazendeiro: dentes e garras. Repetindo: se entregue, mas não entregue tudo.

Um dos problemas mais clássicos da filosofia e da religião: o problema do mal. Na fábula do "Homem mordido por uma formiga e Hermes" encontramos uma das respostas mais incríveis, - e chocantes também -, para este problema. O título da fábula já nos dá uma pista... Eu sugiro que na próxima vez que você embarcar em um navio cheio de gente (ou para aproximar a fábula do nosso mundo: um vagão do metrô lotado de gente ou um ônibus lotado de gente), é bom você torcer para ninguém ali blasfemar contra a divindade. Os deuses são generosos, mas generosos nos dois sentidos. Acho que deu para entender… 

Mesmo o homem bom não hesita em tratar duramente quem o caluniou.
[Antônio Carlos Vianna para a moral da fábula “O Bandido e a Amoreira”.]
Assim, muitas vezes também os honestos por natureza, quando alguns os confundem com os vis não hesitam em agir com perversidade.
[Maria Celeste C. Dezotti para a moral da fábula “O Bandido e a Amoreira”.]

O cordeiro está certo, morrer pelas mãos de um sacerdote em oferenda ao deus em que ele acredita é mais digno do que morrer na boca de um lobo. Dignidade. Mantenha a dignidade até o fim. 

É, de todas as fábulas, a que mais me impressionou: "O Camponês e a Serpente".

Uma guerra é declarada. Quem é pobre tem nada e com nada foge para outra cidade, mas quem é rico vai querer ficar para proteger a sua casa luxuosa. Mais uma vez a humildade e o despojamento é defendido por meio de uma fábula que conta uma história dramática.

Lembro, quando bem criança, de minha mãe lendo e ensinando o que a fábula Bóreas e o Sol ensinava. E o que esta fábula ensina? Ah, eu não vou contar; mas em um mundo violento a lição da fábula é muito bonita.

Quando falamos que a Grécia Clássica nos ensinou a democracia, é bom observar sempre sempre quem era para eles os “cidadãos” e os “não cidadãos”. Pois é, pois é… Na fábula A camela que defecou no rio temos uma amostra da política da Grécia Clássica. E aqui nossa sensibilidade moderna, filha da Revolução Francesa, fica um tanto chocada. Se os cidadãos de uma cidade escolherem líderes ruins vão sentir no focinho algo muito ruim também...

Aposto que os leitores não sabiam que os elefantes têm medo dos leitões e que os camelos não se irritam com as pessoas injustas. Bom, agora vocês sabem.

Para Antônio Carlos Vianna é “A gata e Afrodite”, mas para Maria Celeste C. Dezotti é “A doninha e Afrodite”. Mas a moral da fábula é a mesma e ela também fere nossa sensibilidade moderna. Fere na parte que trata da nossa crença sobre o poder da educação de nos transformar: pois se você nasceu gata ou doninha não adianta a Afrodite escutar o seu pedido e transformá-la em mulher…

Sonhos. Não havia um tesouro, havia piratas como descobriu tragicamente aquele homem. Mas aquele homem havia enganado os deuses. Mas além de armadilhas ou previsões, os deuses gregos usavam os sonhos para conversar diretamente com os seus protegidos.

Mas quem botava os ovos de ouro? Uma galinha, Antônio Carlos Vianna? Ou uma gansa, Maria Celeste C. Dezotti? Na versão de Maria sabemos a origem do animal mágico: era um presente de... de… adivinha de quem? Ele mesmo, o deus Hermes. Mas em ambas as fábulas o fim é triste: o homem mata o animal porque cedeu à ambição. E o homem termina pobre.

Mais política nas fábulas de Esopo. Não era só para Adão que a solidão não era recomendado, mas para os deuses do Olimpo também. Mas Iaweh fez uma parceira na medida para Adão, no Olimpo nos tivemos um sorteio. Eram casamentos arranjados. Mas nasceu Amor entre o último casal a ser formado, justamente o casal onde não houve sorteio sendo unidos apenas porque não haviam mais opções. Era o Ultraje se casando com a Guerra. E eles se amaram muuuuito, como bem sabemos. Como bem sabemos. 

Para a Maria Celeste C. Dezotti era um “herói”, na versão do Antônio Carlos Vianna era um “semideus”. Enfim, na Grécia Clássica você podia ter em casa um altar e fazer oferendas não só para deuses do calibre de Atenas, Zeus, Apolo, Afrodite… Também haviam os semideuses e os heróis. Acho que aí temos o grupo do Hércules, por exemplo. Mas não sou especialista em mitologia grega. Enfim, aquele homem que gastava quase tudo em oferendas foi visitado pelo herói (ou semideus) que falou para ele que estava agradecido pelo carinho, mas era melhor ele parar antes de ficar pobre.

A fábula "As idades do homem" é uma delícia para quem, como eu, ama a filosofia. O humano é criado por Zeus puro e bom; e logo logo sua inteligência e ambição o coloca em problemas. 
Era uma vida curta e feliz, mas… Aconteceu durante uma tempestade de gelo. Sim cavalo, te abrigo do frio se você me der um pouco de seu tempo de vida. Sim boi, te abrigo do frio se você me der um pouco de seu tempo de vida. Sim cachorro, eu te abrigo do frio se você me der um pouco de seu tempo de vida. Resultado deste “vampirismo temporal” é que depois do tempo dado pelos deuses como ideal, os humanos (ou homens mesmo, na versão da fábula), tornam-se fanfarrões como cavalos, dominadores como os bois e quando chega na parte do tempo emprestado do cachorro os homens ficam insuportáveis e resmungões.

Com certeza as leitoras e os leitores sabem que qualquer música de Tchaikóvsky é a encarnação da beleza, assim como o sorriso da Kalki Koechlin é a própria luz do sol para a primavera. Mas vocês já viram o Juramento? É, o juramento. Vocês já viram o Juramento? Um homem manco a te levar a beira do precipício, após você mentir a um amigo… 
 – Mas ele tinha falado que só ia voltar daqui a trinta anos…
Mon ami, promessas são para os mortais… Os deuses fazem o que fazem e pronto. Você só não podia mentir para o seu amigo.

Lembro desta fábula em uma versão urbana (dois cachorros) e ilustrada belamente. Estava em um livro infantil. Mensagem política poderosa. Uma defesa da liberdade. Emocionante encontrar a versão original tantos anos depois. "O Lobo e o Cão". Não é preciso dizer muita coisa. A moral nem é tão legal, melhor mesmo é citar a última frase do texto; da fala do Lobo:
A fome é mais leve que a coleira!
Estados Unidos, Venezuela, liberalismo, socialismo, aquele emprego horrível que vai garantir o meu sonho daqui há alguns anos, minha família para cuidar, o medo, o medo disfarçado de responsabilidade, a responsabilidade, a sereia disfarçada de segurança, a segurança, o tempo que passa tão rápido…

Milhafre, milhafre, que loucura foi essa? Atacou quem nunca te fez mal? Que loucura foi essa? Na Grécia Clássica você tem que saber o que lhe cabe fazer, o que lhe cabe desejar.

A vida é instável, então é bom você saber onde se apoiar. Família, amigos: qual é a sua raiz? 

Ensina o meu amado Will Durant nada é tão aborrecido quanto a lógica e também nada é tão importante. Pois pois, as vezes a lógica sabe ser divertida e curiosa. Na versão da Maria Celeste C. Dezotti, as fábulas do Esopo foram agrupadas em ordem alfabética. Um critério como outro qualquer e seguido a risca. Pois pois, isso colocou juntinhos as fábulas “O passarinheiro e a perdiz” e “O passarinheiro e as pombas”. E daí? E daí que a moral das duas fábulas dialogam: não traia os parentes, a não ser que você seja uma pomba e já esteja sob o domínio de uma rede e de um patrão dominador.

A moral nos ensina que não devemos invocar os deuses em vão. Como, quando por exemplo, uma pulga morde o nosso dedão do pé. Mas a fábula me interessou porque é um exemplo de quem nem sempre a fábula e sua moral são próximas num discurso de coerência fácil: as vezes há ambiguidade e sofisticação no meio do caminho. A tentação é grande, mas as fábulas não merecem ser lidas com ligeireza leitores modernos e arrogantes!

Um encontro memorável: a fábula famosa “A raposa e o cacho de uvas”. O texto não é muito rico.

Um diálogo entre as fábulas “O lobo e o cão”, “O onagro e o burro” e “O rato silvestre e o rato caseiro”. O espectro que ronda por aqui é a liberdade. Não se deve ser insubordinado e nem inflexível (quando não for livre); a fome pesa menos que a coleira e a vida mais simples é mais segura do que uma vida luxuosa (ficar para defender a mansão ou fugir?). Saber ceder, não ser escravo dos desejos e não ser escravo dos luxos.

As fábulas “A serpente e a águia” (Maria Celeste C. Dezotti) e “O camponês e a águia” (Antônio Carlos Vianna). Diferentes, mas “parentes”. Diálogo, mas o espectro desta vez é o da gratidão. Ao escapar de uma serpente ou de um muro que parecia resistente e não era; esteja sempre pronto para agradecer e retribuir o favor. Faça o bem e a gratidão vai esperar por ti.

Outro encontro memorável: a fábula famosa “A tartaruga e a lebre”. O texto aqui, diferente de “A raposa e o cacho de uvas”, me pareceu mais rico. Poeticamente e filosoficamente. 
Cito um trecho que para mim é chave: “E a tartaruga, consciente de sua própria lentidão, não parou de correr.” 
O esforço compensa, esforço com consciência compensa ainda mais.

Vingança não é justiça, a fábula "O touro, a leoa e o javali" é violenta e trágica. É verdade. Mas também é verdade que há sim uma longa ponte/diálogo entre esta fábula de Esopo e a “regra de ouro” de Confúcio, a “regra de ouro” do Antigo Testamento, a “regra de ouro” de Jesus e o “imperativo categórico” de Immanuel Kant. A moral da fábula na versão de Maria Celeste C. Dezotti:
Esta fábula mostra que uma pessoa será medida com a mesma medida que ela usa para medir os outros.

Escute o que a raposa ensinou para o urso amigo dos homens. Não seja ambicioso, hipócrita e nem presunçoso. (Mas que urso era aquele, héin…)

Depois de um urso sem noção, um velho sem noção. Invocar a Morte para que… ela carregasse a lenha que estava pesada demais! Ah, essa foi ótima! Todo mundo ama a vida. Parabéns ao velhinho sem noção.

E na última fábula que selecionei, - “Zeus e o tonel de bens” –, o diálogo é com o mito “A caixa de Pandora”. Que os bens voem em direção aos deuses ou com os males que voem se espalhando pelo mundo dos humanos por causa de nossa curiosidade irresponsável; sobra sempre a esperança a alimentar os nossos corações.
Então, leitora e leitor: você acredita?