sábado, 20 de fevereiro de 2021

O Espelho, 1882

 

O universo desta aranha Salticidae pode ser tão infinito e glorioso quanto o nosso. Rio Acima, 2009.




O Espelho” (Papéis Avulsos, 1882)


Nem esperei o Pai Machado de Assis dá-me a quarta frase do conto e eu já estava apaixonado pelo texto. Amigos em uma noite, onde a luz da sala misturava-se à luz da Lua, decifrando os maiores mistérios da existência. Eu já contei a vocês que acho que eu comecei a gostar de filosofia ainda bem criança por causa das conversas de adulto que eu ouvia durante os churrascos de família?


Se discordarem de mim é para a gente apagar o charuto e ir dormir. Adorei essa. Anotei. Bom para o Brasil de 2021, sempre violento e com o barulho da falta de diálogo.

Se discordarem de mim, é mais um pedaço de bolo de fubá e um gole de café e “tchau!”.


A curiosidade está na base da civilização. Will Durant acrescenta o Pai Machado de Assis ao lembrar do dinheiro.


Não é muito, mas um pouco do cotidiano de uma casa na época da escravidão podemos conhecer por meio deste conto.


Voltarete” e “piparote”, duas palavras de origem espanhola da época do Pai Machado de Assis.


Eu realmente amei este conto!

Todo o humano tem duas almas.

Uma alma que olha de dentro para fora e outra alma que olha de fora para dentro.

A nossa alma que olha de fora para dentro pode ser do tipo mutante; ser o poder e depois ser um cargo seguro na Secretaria de Transporte onde a gente se acomoda ou mesmo uma linda coleção de sapatos ingleses. Raramente esta alma é do tipo que seja apenas uma coisa, a não ser que você seja um Júlio César e aí o poder e apenas o poder seja esta sua segunda alma, entende? … (Aqui eu lembro de mais um trecho do meu Bryan. Que a Editora Martins Fontes perdoe-me mais uma vez!

Quando li as palavras “a solução do enigma do mundo somente é possível através da ligação correta entre a experiência exterior e a interior”, foi como se alguém tivesse acendido uma luz dentro da minha cabeça.”

(CONFISSÕES DE UM FILÓSOFO, de Bryan Magee; tradução de Waldéa Barcellos, Editora Martins Fontes, 2001).

Machado e Schopenhauer; não é raro que duas pessoas cheguem à mesma conclusão.

O humano é metafisicamente uma laranja. Uma laranja… Eu sou uma laranja. E porquê não? Gostei disso. Eu sou uma laranja! Lembrei-me da professora de gramática e literatura do colégio que sempre sempre elogiava o Dicionário de Símbolos. Para procurar, se houver, o verbete “laranja”. Já encontrei este livro em livrarias, mas ainda não o comprei. Se não me falha a memória o livro é de autores franceses.


E por falar em franceses tem o Jean-Paul Sartre, pois o nosso Pai Machado de Assis antecipou “A Náusea”. (Não conheço esta obra do existencialista francês; minha referência aqui é aquele vídeo do site da internet YouTube, onde o professor de filosofia Clóvis de Barros Filho conta aquela história do emprego perdido e do fichário de alunos deixados na padaria.). O garçom de “A Náusea”; a psicóloga presunçosa do Recursos Humanos; e o Espelho. Ora, ora, leitoras e leitores. O que a gente é? Cumprimos bem o papel que a sociedade espera de gente? Sem sentirmos escravos e sem sentirmos enjoo e sem confundir um espelho que não mente? Bom, não sei qual foi a resposta aí do outro lado do monitor do computador ou do celular; o que eu sei é que, pelo menos, os escravos do conto puderam fugir. Mas a gente não é escravo, não é?


Gostei muito do conto, mas não sei se concordo com o título dele.


Óps, mencionei que gostei muito do conto e não vou fazer uma citação? É gostoso fazer uma citação, a gente se sente na pele de quem escreve o livro! Já imaginaram como é estar na pele do Pai Machado de Assis? O sangue brasileiro nosso pega fogo.

Quando, muitos anos depois, li uma poesia americana, creio que de Longfellow, e topei com este famoso estribilho: Never, for ever! — For ever, never! confesso-lhes que tive um calafrio: recordei-me daqueles dias medonhos. Era justamente assim que fazia o relógio da tia Marcolina: — Never, for ever!— For ever, never! Não eram golpes de pêndula, era um diálogo do abismo, um cochicho do nada. E então de noite! Não que a noite fosse mais silenciosa. O silêncio era o mesmo que de dia. Mas a noite era a sombra, era a solidão ainda mais estreita ou mais larga. Tic-tac, tic-tac. Ninguém nas salas, na varanda, nos corredores, no terreiro, ninguém em parte nenhuma... Riem-se?

Sim, parece que tinha um pouco de medo.

Oh! fora bom se eu pudesse ter medo! Viveria.”

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