sábado, 7 de outubro de 2023

Antologia do Folclore Brasileiro 3 de 25

 

Antologia do Folclore Brasileiro 3 de 25

 

 

 

Mas olha a biografia do Anthony Knivet (?-?)! Caracas bicho meu irmão!

Pirata e saqueador da turma do Tomaz Cavendish vindo aqui para as colônias espanholas por volta de 1591. Chegou até Santos. Nessas idas e vindas ficou doente. Foi abandonado na baía de Guanabara. Caiu nas garras do governador Salvador Correa de Sá, que não era um patrão muito melhor que Cavendish. Virou pouco mais que um escravo. Caçando, pescando, aproveitando as expedições para escravizar indígenas para fugir na primeira oportunidade. Tentava sempre. Tentou mil vezes e foi recapturado mil e uma. E toda vez que era recapturado, apanhava e era humilhado. Uma vez conseguiu fugir até Angola, mas até na África foi recapturado. Em 1602 foi a Lisboa na comitiva de Salvador Correa de Sá como intérprete. Ficou doente e se recusou a voltar ao Brasil. Foi punido e foi morar na Inglaterra. Não se sabe como chegou à ilha britânica, se porque foi libertado ou se conseguiu sua derradeira fuga. Contou sua história brasileira em um livro de sucesso. Não se sabe quando e onde morreu.

 

 

Nos buracos da face, pedras verdes. Era o rei canibal Morubixaba. Gritava, batia no peito e nas coxas e ia de um lado para o outro. A descrição de Anthony Knívet é deliciosa: o rei canibal gritava “como se houvera perdido o siso”. Lembrando que aqui “siso” pode ser o dente ou a razão mesmo. Mas o final dessa história guaianás é feliz.

 

 

Na antiga Grécia ou na antiga Roma, ou entre os índios do Ivo D´Evreux (1577-1629); a vestimenta certa é um estímulo poderoso para o soldado ir à guerra.

 

 

Como convencer as formigas tanajuras saírem das tocas para serem capturadas e assadas e comidas? Ora, é fácil. Você canta.

Vinde, minha amiga,

Vinde ver a mulher formosa,

Elas vos dará avelãs.

 

 

Esta anuncia a chuva, aquela também anuncia a chuva e esta outra também anuncia... a chuva. As três constelações que os tupinambás do Frei Claude d´Abbeville (?-1616) conhecem com nomes próprios. A maioria das estrelas eles chamam genericamente de jaceí-tatá.

O quê? Querem saber o nome indígena das três constelações que anunciam as chuvas? Não digo. Apenas destaco que é evidência da importância das chuvas para aqueles índios.

- Mas isso é óbvio, não?

Não, branquelo da cidade grande que nem sabe o que é seca de verdade; não é.

(Correção-2023: “branquelo da cidade grande que nem sabe o que é seca de verdade ainda”.)

 

 

Ainda a água, ainda a chuva. Muitas vezes acontece, depois de uma grande tempestade, a lua nascer vermelha nos céus. É por causa das feridas causadas pela estrela vermelha-cachorro januare que sempre persegue a Lua. Mas principalmente significa a proximidade da morte. Os homens ficam felizes porque vão reencontrar os avós guerreiros. Mas as mulheres tem medo da morte, então choram alto protestando.

 

 

Os tupinambás conheciam bem o céu estrelado. Planetas e fases da lua. Marés e o sol e as estações. Claro que com outros nomes e com os seus mitos, como explicação. Claro, claro.

Ao mesmo tempo que quero destacar a estrela que se chama “menino que bebe manipol” (conomimanipoere-uare), quero observar  que devemos reforçar o respeito pelo conhecimento pré-científico de astronomia por parte dos tupinambás.

 

 

Um trecho preconceituoso senhores Frei Claude d´Abbeville e Des Vaux? Hum... Mais respeito à autoridade dos pajés.

 

 

Era jovem e mesmo assim Jorge Marcgrave (1610-1644) foi o espírito mais completo que a ciência teve no século XVII (1601-1700). Etnógrafo, astrônomo, antropólogo, meteorologista e etc., como era comum numa época que a ciência era mais aventureira e ainda não estava dividida entre tantas disciplinas.

 

 

Jorge Marcgrave era brilhante, sem dúvida, mas a religiosidade indígena o confundiu quando ele esteve no Brasil. Tem rituais, mas não religião? Não conhecem Deus, mas falam em Tupã? Fala que os índios acreditam em céu e inferno, mas depois que não acreditam em alguma ideia de céu ou inverno. Não há veneração e cerimônias, mas fala do tronco de madeira enfeitado para os espíritos e as cerimônias dos sacerdotes.

A incoerência eu debito no fato que, de fato, era outro mundo, outra língua, praticamente outro universo que Marcgrave estava diante de si. Ele usava os “óculos” europeus de que dispunha. Via e não via o que via. Era mesmo difícil para ele.

 

 

 

Livremente inspirado em Antologia do Folclore Brasileiro, 1944, organizado pelo

Professor dos professores,

o mestre dos mestres,

a mistura de Aristóteles e poesia,

a mistura do luar que perfuma o rio Potengi com o sol que vivifica o Rio Grande do Norte:

Luís da Câmara Cascudo.

(2003, Global Editora e Distribuidora Ltda, São Paulo, edição em dois volumes.)

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